Soul
e Funk (Black Music)
Da união entre as
tradições musicais afro-americanas com a música sacra de origem protestante,
mais elementos do Blues e, mais tarde, do R&B, na transição da década de
1950 para a de 1960, desenvolveu-se uma música profana notabilizada pelas orquestração
elaborada, harmonias elegantes e pelos vocais angelicais, além das letras ora
políticas, ora sentimentais, muito em função do trabalho de Berry Gordy Jr. na
gravadora Motown Records (fundada em 1959) de Detroit que foi fundamental para
o estabelecimento desse novo estilo musical, o Soul, também chamado justamente
de “O som da Motown”. São ótimos exemplos da grandiosidade da Motown sucessos
como "ABC", do Jackson Five; "You Keep Me Hangin' On", com
Diana Ross e The Supremes; "Let´s Get it On”, de Marvin Gaye; "I
Can´t Help Myself" com os The Four Tops; "My Girl", com The
Temptations; além de centenas de outros.
Portanto, o Soul
é resultado da união das experiências profanas e envolventes da versão
acelerada e festiva do Blues, o Rhythm and Blues; com o Gospel, a música
protestante negra, consequência eletrificada e pungente dos Spirituals, quase
sempre cantada por coros efusivos e vibrantes com o intuito de adorar a Deus, além
do toque da Motown que tornou essa música um sucesso para muito além da
comunidade negra. Tal processo cultural é a prova das infinitas e imprevisíveis
possibilidades de aproximação entre as referências culturais ou ideológicas
mais distintas. São
exemplos: Ray Charles, Otis Redding, Sam Cooke, Curtis Mayfield, Smokey
Robinson, The Temptations, The Comodores, Jackson 5, Marvin Gaye, Gladys Knight
& the Pips, Martha Reeves & The Vandellas, The Marvelettes, Diana Ross
(e o grupo The Supremes), Aretha Franklin, The Four Tops, Booker T and the MGs,
Solomon Burke, Nina Simone, Dusty Springfield, Stevie Wonder, etc.
Ao longo da
década de 1960 e 1970, o Soul foi sendo modificado por várias influências que
potencializaram outro ritmo mais dançante, mais agressivo e com letras
politicamente ainda mais engajadas, que passou a ser chamado mais tarde de
Funk. Com batida fortemente sincopada e com grandes e agitados “nipes” de
metais, construiu-se uma música que ao mesmo tempo que era defensora da causa
dos negros nas décadas de 1960 e 1970 especialmente, era um ritmo enérgico,
alegre e sedutor, perfeito para celebrações agitadas, dançantes e vigorosas.
Por vezes, é difícil separar as influências Funk e Soul em uma mesma música,
até porque muitos artistas não tiveram qualquer interesse em separá-los de
forma clara ao longo de sua produção musical. São exemplos: James Brown, mestre maior desse
ritmo; Sly and Family Stone; Funkadelic; Parliament, Kool and the Gang;
Kashmere Stage Band; The Metters; Average White Band; Maceo Parker; Hank
Ballard; Jimmy "Bo" Horne; etc.
No Brasil, esses
estilos musicais desenvolvem-se na periferia de grandes cidades como o Rio de
Janeiro e São Paulo, nos famosos Bailes Black ou Bailes da Pesada ou ainda
Festas Hi-Fi, onde se ouvia uma grande gama de estilos de música de origem
invariavelmente negra como o Funk de Sugarhill Gang, KC and Sunshine Band, War,
Funkadelic, Sly and Family Stone, James Brown, etc.; o Soul de Wilson Pickett,
Otis Redding, The Commodores, Marvin Gaye, etc.; o R&B de Aretha Franklin,
Diana Ross, Jackson 5, etc., o Samba-Rock de Jorge Ben, Bebeto, Trio Mocotó,
etc.; o Samba-Funk de Dom Salvador e Grupo Abolição, Black Rio, etc.; o Miami
Bass de 2 Live Crew, DJ Magic Pike, etc.; e o RAP de Kurtis Blow, Grandmaster
Flash, Afrika Bambaataa, etc. Esse som tocava nos toca-discos (pick-ups) de DJs como Ademir Lemos e Big Boy, em paralelo surgiriam as equipes de som,
inspiradas nos “Sound Sytems” jamaicanos e norte-americanos, como são os casos
da Chick Show, Cash Box, Zimbabwe, Furacão 2000, etc.
Fonte: Equipe
Music Rio.
Nesse contexto,
os Bailes Black desenvolveram-se velozmente, ainda que com pouco do aspecto
político muito presente no Soul e no Funk norte-americanos em função da revolução
que ocorria em paralelo com seu desenvolvimento em função da mobilização política
de grupos e pessoas como Black Panthers, Nação Islã, Rosa Parks, Martin Luther
King, Malcolm X, Muhamad Ali-Haj, etc. Além dessa questão ideológica,
importante ressaltar que, no Brasil, as fronteiras entre esses estilos ficaram
sutis graças ou mesmo ignoradas graças às multifacetadas obras de Tim Maia,
Wilson Simonal, Gerson King Combo, Hyldon, Cassiano, Dom Salvador e Orquestra
Abolição, Sandra Sá, Trio Ternura, Banda Black Rio, etc. Isso porque o que
viria a ser chamado com o intuito simplificador de Black Music, por parte da
mídia brasileira, seria também influenciado por ritmos brasileiros como o
samba, por exemplo. É nesse ambiente que vão surgir como decorrência do que se
ouvia o RAP e o Funk Carioca no Brasil.
Para ver, ouvir e ler:
O nascimento da Motown
"You Keep Me Hangin' On", com Diana
Ross e The Supremes
"ABC", do Jackson Five
"Let´s Get it On”, de Marvin Gaye
"My Girl", com The Temptations - 3’18’’
"I Can´t Help Myself", com The Four
Tops – 4’23’’
(Eu assistiria tudo, desde o primeiro minuto.)
Playlist de um Baile Black no início da
década de 1980.
Bailes Black ou da Pesada
Bailes Black (SP) – uma história
Bailes da Pesada (RJ) – breve história
Tim Maia
James Brown no Soul Train
Uma curiosidade, James Brown no Brasil (1988)
Playlist sobre a influência da música negra
norte-americana na brasileira
Playlist sobre a música negra brasileira
Funk Carioca
Primeiramente, é
crucial afirmar que esse ritmo musical brasileiro guarda pouca relação com o
Funk do mestre James Brown, porque o Funk Carioca desenvolveu-se da convivência
e da confusão entre muitos ritmos como o Miami Bass, o Soul, o Samba-Rock, o
Charm (Rhytmn’n’Blues) e o próprio Funk, que animavam os famosos Bailes Black,
Bailes da Pesada ou Festas Hi-Fi na virada da década de 1970 para 1980 no Rio
de Janeiro. Nessas oportunidades, todas as músicas que eram executadas pelos
DJs, tais como Ademir, Cidinho Cambalhota, Mr. Funk Santos, Messiê Limá, etc.,
eram chamadas genericamente de Funk, ainda que o Funk Carioca seja mais ligado
a ritmos como o Miami Bass, ritmo nascido na Flórida caracterizado por batidas
rápidas e graves e letras com forte apelo sexual. Ao longo do desenvolvimento
do Funk carioca, os bailes - até então, realizados em casas de show em locais
centrais do Rio, mais tarde seriam "banidos" para as periferias da
capital fluminense e da região metropolitana. Mais tarde, expandiram-se para
áreas onde equipes de som rivais (Chic Show, Soul Grand Prix, Furacão 2000,
Black Power, Equipe Modelo, Cash Box, etc.) enfrentavam-se para saberem quem
tinha o som mais potente, o MC mais inspirado, o melhor DJ ou o “melô” mais popular.
No fim do século
XX, os bailes funk tornaram-se um fenômeno cultural que alcançaria a classe
média, o que permitiu a realização frequente de bailes também em áreas nobres
da cidade. Para explicar esse processo, tem grande destaque o DJ Marlboro, um
dos muitos protagonistas do Funk Carioca, o qual inclusive foi um dos
principais responsáveis pela internacionalização desse ritmo. Atualmente, esse
importante fenômeno cultural tem se diversificado por causa do trabalho de MCs
e DJs com produções com batidas e temas bem brasileiros, ainda que se mantenham
as batidas graves e repetitivas e as músicas com forte apelo sexual, ainda que
a violência, a vida na periferia, também sejam assuntos alcançados pelo Funk
Carioca que se estabeleceu no Brasil como um ritmo muito popular no país inteiro
a partir do início do século XXI.
Convivem com essa
versão hegemônica versões mais politizadas, hedonistas; apológicas do crime
organizado, da violência e das drogas (“Proibidão”); ou mesmo os que, de forma
bem humorada, tratam do cotidiano de grupos alvos de preconceitos como as
mulheres. Os primeiros “melôs” foram “Feira de Acari”, “Melô do tagarela”, etc.
São exemplos de diferentes formas desse ritmo: Latino, Copacabana Beat, MC
Marcinho, Claudinho e Bochecha, Mr Catra, Tati Quebra-Barraco, MC Leozinho,
etc.
Para ler, ouvir e ver:
Baile do Furacão 2000 com MC Marcinho
Breve História do Funk Carioca
Funk Ostentação
RAP
(“Rhythm and Poetry”
ou "Rime and Poetry")
Ritmo nascido na
periferia de cidades norte-americanas, especialmente New York, produto de uma
cultura urbana, negra e periférica que é parte de tradições culturais
caracterizadas por expressões corporais ligadas à dança (Break), musicais (RAP)
e visuais (grafite), as quais são os pilares de movimento cultural chamado Hip
Hop. O RAP é resultado de várias e evidentes influências de tradições musicais
e comportamentais dos chamados “Sistemas de Som” jamaicanos, que nada mais eram
que festas populares, baratas e democráticas realizadas na periferia de Kingston, voltadas para um público
jovem sem muitas oportunidades de lazer, que via naquelas grandes aparelhagens
de som comandadas por um Disc-jóquei (DJ) e um Mestre de Cerimônia (MC) tanto
uma oportunidade de diversão como um canal de expressão. Esses DJs e MCs, entre
versos improvisados e discos inicialmente de R&B, conseguiam divertir e
inspirar milhares de pessoas a, mais tarde, construir pontes entre músicas
folclóricas jamaicanas como o Mento e as influências norte-americanas que
ouviam, para criar ritmos musicais como o Reggae, Ska e Dub.
Como manifestação estética e musical, o RAP, nas suas origens, consiste no cantar falado e ritmado de um MC acompanhado por DJ
que usa bases presentes em “Long Plays” (LPs) geralmente de bandas e
intérpretes clássicos do Funk como James Brown, Sly and Family Stone, The
Metters, Kashmere Stage Band, etc., ainda que com a aplicação de texturas,
novos andamentos e os famosos “scratches”, para que os MCs
"cantassem" sobre essas construções musicais de intenso e marcado
ritmo. No início, a partir de vozes de Gil Scott-Heron e Kurtis Blow, o RAP foi
uma espécie de porta-voz das angústias, das insatisfações e do estilo de vida
dos negros das comunidades pobres e urbanas dos EUA, ou seja, tinha um
componente político indiscutível. Mais tarde, ao longo da década de 1990, nos
EUA, o RAP perdeu em parte seu aspecto politizado para dar lugar a letras de
caráter hedonista, revanchista, misógino, etc., que foram responsáveis pela
consolidação de um subestilo do RAP chamado Gangsta. Atualmente, o RAP tornou-se
um dos elementos mais importante da cultura pop mundial, a ponto de ser uma
forma de inspiração em revoltas populares em países de culturas aparentemente
tão diferentes da estadunidense como Tunísia e Egito. São exemplos: DJ Grandmaster Flash, Afrika
Bambaataa, DJ Kool Herc, Lost Poets, Public Enemy, Run DMC, De La Soul, N.W.A. - Niggas
With Attitude, The Notorious B.I.G., Tupac Shakur, The Roots, Dr. Dre, etc.
No Brasil,
desenvolveu-se a partir dos Bailes Black ou Festas Hi-Fi na periferia
especialmente de São Paulo no início da década de 1980. A cultura Hip-Hop brasileira desenvolveu-se em torno do break nas saídas de estações de metrô
paulistanas sob a liderança de dançarinos como Nelson Triunfo. Mais tarde, expoentes dessa cultura como Thaíde e DJ Hum seriam um
dos primeiros a cantar o novo ritmo musical em português, ainda que muito fieis
às ideologias que fomentaram o RAP na periferia de cidades como New York.
Atualmente, no Brasil, o RAP continua fiel aos princípios básicos do ritmo
quanto à temática e ao plano melódico e rítmico, quase sempre politizada a
partir de um ponto de vista marcadamente negro e periférico. Quanto ao som,
experiências de união com o samba, como é o caso de alguns discos de Marcelo
D2, apresentaram novas possibilidades para o desenvolvimento desse gênero
musical. São referências fundamentais no RAP brasileiro: Thaíde e DJ Hum,
Racionais MCs, Pavilhão 9, Planet Hemp, Instituto, Sabotage, Camorra, Emicida, Criolo, Kamau, Rael da Rima, Projota, etc.
Para ver, ouvir e ler:
Freestyle
Batalha de MCs
Breves histórias do
RAP
Aprofundamento:
Nenhum comentário:
Postar um comentário