O
Rock, apesar das aparências e de outras influências provenientes do Folk e do
Country, é filho de mãe negra, é filho do Blues, ritmo
nascido no chamado “sul profundo” dos EUA, na área do Delta do Mississipi e nas
imediações também rurais dessa região e de outros estados sulistas.
O Blues constituiu-se
como crônica musical da vida de trabalho, poucas alegrias, humilhações e
preconceito sofridos pelos negros norte-americanos na virada do século XIX para
o XX. Além desse, outros temas dominavam as predileções dos primeiros “bluesmen”,
a saber: o sexo, o demônio, a bebida, a noite e os relacionamentos afetivos. De
modo geral, o Blues é uma música de harmonia simples, de ritmo melancólico e
solos de guitarra, gaita e piano comumente, que simulavam um lamento, um choro
ancestral – a famosa “blue note” - vindo da África manifestando-se contra a
violência, o degredo e as muitas tentativas de aculturamento sofridas pelos
negros chegados nos EUA por parte dos brancos norte-americanos.
Do ponto de vista musical, é um dos
pilares do Jazz e em alguns momentos confunde-se com ele, especialmente nas
duas primeiras décadas do século XX. Sobre outro aspecto do processo de
urbanização do Blues com o desenvolvimento do chamado Chicago Blues e, mais
tarde, do Rhythm and Blues (R&B),
é importante perceber a relação direta desses novos estilos como consequências
do êxodo rural dos negros do sul dos EUA que buscavam as cidades do norte desse
país com o intuito de buscar melhores condições de vida, de escapar de leis
segregacionistas como as “Jim Crow” e de evitar organizações racistas como a Ku
Klux Klan (KKK).
Em Chicago e em outras cidades do
norte, esse migrantes negros encontraram uma parte mais desenvolvida e liberal
dos EUA, daí muitos negros do sul procurarem melhores condições de vida e
trabalho, além de uma sociedade menos preconceituosa, entretanto quase sempre
não a achavam, porque eram obrigados - por questões também econômicas - a
morarem em guetos pobres e, portanto, continuavam de certa forma marginalizados
na sociedade.
A partir de então, variantes do Blues
passaram a ser aceleradas e eletrificadas como é o caso do Chicago Blues e o
Detroit Blues, assim o Blues passou a influenciar de forma mais contundente no
desenvolvimento de ritmos derivados e dependentes dele, tais como: o Rhythm and
Blues (R&B), o Rock, o Funk, o Soul e o RAP, os quais são consequências
estéticas desse primordial gênero musical norte-americano, que, junto ao samba,
influenciou a música mundial numa proporção e abrangência incomparável. O blues
ao longo da primeira metade do século XX foi diversificando-se em muitos
estilos tais como o Delta Blues, o Piedmont Blues, o Country Blues, o Chicago
Blues, o Detroit Blues, o Jump Blues, etc. Entre os músicos de blues,
destacam-se alguns nomes como Charlie Paton, Son House, Leadbelly, Robert
Johnson, Willie Dixon, Muddy Waters, B.B. King, Buddy Guy, Pinetop Perkins,
Hound Dog Taylor, Koko Taylor, Blind Wille McTell, Blind Lemon Jefferson,
Arthur “Big Boy” Crudup, Blind Willie Johnson, Big Mama Thornton, Eddie Boyd,
Sonny Terry, Elmore James, Willian Clarke, Fenton Robinson, Howlin' Wolf, J. B.
Lenoir, John Lee Hooker, etc.
Assim, o ritmo musical nascido da união
de influências estéticas negras como o Blues e, seu filho de cadência acelerada
e letras subversivas, o Rhythm'n'Blues, com ritmos musicais como o Country, o
Bluegrass e o Folk, os quais unidos das mais diversas formas permitiriam o
nascimento do Rock’n’Roll entre as décadas de 1940 e 1950 com mais evidência,
ainda que já se pudesse antevê-lo em produções anteriores de músicos negros
como Chuck Berry ou Little Richards.
O rock nasceu cercado de preconceitos
impostos pela sociedade branca, protestante e conservadora da década de 1950
nos EUA, muito em função do ritmo acelerado, das letras ideologicamente
distintas da moral vigente à época, da forma frenética de dança-lo, da
associação com a rebeldia adolescente, etc. Entretanto, a partir da década de
1960 foi lentamente assimilado pela cultura urbana e jovem que se formava até
tornar-se parte fundamental da indústria cultural a partir da década de 1970.
Quanto à expressão, ela literalmente
significa "balançar e rolar" e era uma gíria dos negros
norte-americanos do início do século XX, para referir-se comumente ao ato
sexual, que figurava com certa constância em muitas letras de blues e R&B
da primeira metade do século XX. O nome efetivamente foi dado pelo radialista
Alan Freed, também conhecido como "Moondog", que foi um disk-jockey
(DJ) norte-americano, tido como o criador do termo "rock 'n' roll" no
início da década de 1950 como referência à música de pioneiros do Rock como
Chuck Berry, Fats Domino, Little Richards, etc.
Alan Freed foi crucial na promoção do
rock, especialmente, em atrair uma juventude branca e urbana dos EUA para uma
música derivada do Blues que, em um primeiro momento, era feita quase
exclusivamente por negros, com isso ela acabou por ser responsável pela
projeção por meio de seu muito prestigiado programa de rádio de muitos nomes
que seriam mais tarde vistos como pais do rock. Além disso, também organizava
shows, chamados naquele momento de “Rock‘n’Roll Jamboree”m os quais foram
pioneiros ao reunir em uma mesma plateia e num mesmo palco, negros e brancos.
São nomes representativos do chamado Rock’n’Roll
clássico e do Rockabilly: Chuck Berry, Little Richards, Jerry Lee Lewis, Fats
Domino, Bill Halley, Roy Orbison, Bo Diddley, Hank Willians, Muddy Waters,
Buddy Holly, Johnny Cash, Elvis Presley, etc.
A partir da década de 1960, com as influências do
Folk, da “Invasão britânica”, do revigorado Blues, das experiências com drogas
alucinógenas, do ideário Hippie, do oriente indiano, entre outras,
desenvolveram-se inúmeras vertentes do rock como o Blues Rock (Canned Heat,
Yardbirds, Taste, Blue Cheer, Janis Joplin, Jimi Hendrix, Bacon Fat, etc.), o
Folk Rock (Bob Dylan; The Band; Crosby; Stills, Nash and Young; Buffalo
Springfield; etc.), o Rock Progressivo (Pink Floyd, Yes, Jethro Tull, Rush, Van
de Graaf, King Crimson, Gentle Giant, etc.), o Rock Psicodélico (Grateful Dead,
Jefferson Airplane, etc.), o Hard Rock (Led Zeppelin, Deep Purple, Humble Pie,
Free, etc.), o Heavy Metal (Black Sabbath, Dust, Buffalo, etc.), o Punk Rock
(Stooges, MC5, etc.), etc.
O Rock brasileiro nasceu oficialmente
com uma versão do clássico de Bill Haley & His Comets: “Rock Around the
clock”, que ficou mundialmente conhecida por fazer parte do sucesso do cinema
“Blackboard jungle”. Era 1955, quando a cantora Nora Ney lançou “Ronda das
horas” em ritmo diferente do original, porque mais parecia um Foxtrot do que um
Rock. Mais tarde Cauby Peixoto com “Rock and Roll em Copacabana”; Sérgio Murilo
com “Broto legal” e Cely Campelo com os clássicos “Estúpido cupido” e “Banho de
lua” seriam transformados em ídolos da juventude brasileira nos anos
posteriores. No final da década de 1960, o primeiro movimento organizado desse
gênero musical, a Jovem Guarda, seria desenvolvido no Brasil em torno das
figuras de Erasmo e Roberto Carlos, ainda que fosse uma música distante do que
se fazia à época nos EUA e na Inglaterra, porque ingênua, apolítica e, para
muitos, mera cópia do que se havia feito nesses países dez anos antes.
Também vale destacar o Tropicalismo e
os Novos Baianos, que dialogariam intensamente com a vanguarda roqueira
norte-americana e inglesa; o som de bandas como Secos e Molhados, Mutantes, Som
nosso de cada dia, A Barca do Sol, A Banda, Som Imaginário, Ave sangria que
tinham claras influências do rock psicodélico e progressivo feito no exterior;
o Samba-rock, também chamado sambalanço, samba-soul, suingue, que foi uma
associação feita entre o som da guitarra elétrica e a sonoridade do Samba, o
que produziu um ritmo único também pelas letras leves e despretensiosas; as
influências Punk em diferentes níveis em bandas como Aborto Elétrico, Plebe
Rude, Capital inicial, Legião Urbana, Olho Seco, Ratos de porão, Inocentes,
etc.; as influências do rock inglês e da cultura Mod em bandas como Ira e
Violetas de Outono; as múltiplas influências Rock e Pop de bandas como Titãs,
Ultraje a rigor, Barão Vermelho, Paralamas do Sucesso, RPM, Blitz, etc.; a
influência do som de Black Sabbath, Motorhead, Iron Maiden, Metallica, etc. no
som de bandas brasileiras como Sarcófago, Sepultura, Angra, Viper, entre muitas
outras; e o multiculturalismo e as referências múltiplas e imprevistas em
bandas como Nação Zumbi, Mundo Livre S.A., Cordel do Fogo Encantado, Móveis
Coloniais de Acaju, Sheik Tosado, Pata de Elefante, Burro Morto, Mombojó. Porcas
Borboletas, Macaco Bong, etc.
Para ouvir:
Son House - Death
Letter Blues
Robert Johnson - Me
and the Devil Blues
Lightin' Hopkins - Baby
please don't go
Howlin' Wolf - Evil
Etta James - I'd
Rather Go Blind
Muddy Waters - Got My Mojo
Workin'
Muddy Waters - Mannish boy
(from the album "Electric mud")
John Lee Hooker
- Think Twice Before You Go
Chuck Berry - Johnny
B. Goode
Little Richard - Long
Tall Sally
Fats Domino - Ain't
That A Shame
Bo Diddley - Bo
Diddley
Bill Haley & His Comets- Rock Around The Clock
Elvis Presley - Jailhouse rock
Pat
Boone -Tutti frutti
Aprofundamento:
Uma breve história sobre os primeiros anos do Rock
Um texto interessante sobre os anos iniciais do Rock
Caro Estéfani, muito boa sua postagem! Sempre bom ler sobre a história do Rock e, vindo de vc, sempre se aprende algo novo!
ResponderExcluirSó teria uma consideração a fazer! Acho que o rock nacional não surgiu e se consolidou como uma mera influência do rock americano ou inglês. É bom ressaltar que ao aterrisar no Brasil esse estilo, feito por brasileiros, ganhou mesclas muito interessantes, criando novos ritmos únicos e característicos do Brasil, um país musicalmente caracterizado pelas misturas.
Daí é importante ressaltar como várias bandas brasileiras são extremamente reconhecidas no exterior e fizeram o contrário: influenciaram o surgimento de novos estilos e bandas no exterior.
Alguns exemplos: o som característico dos Mutantes nos seus primeiros álbuns é algo realmente difícil de situar dentro de um estilo. Apesar de lembrar bandas de progressivo, a mistura com estilos latinos, samba, música sertaneja de raiz entre outros criou uma mistura psicodélica única que é tida por muitos apreciadores mundo afora como uma grande influência. Basta ver o tanto que os shows deles com as novas formações atraem público (claro que o estilo deles hoje é bem diferente)...
Outro exemplo é o Sarcófago. Existem bandas como o Slayer que já inclusive fizeram tributos ao Sarcófago! Importante reconhecer que a influência também pode ocorrer no sentido contrário.
Uma outra coisa curiosa é perceber influências de estilos nacionais na música internacional. Pegue o riff de smoke on the water e ouça a bossa "maria moita" de Carlos Lyra. Qualquer semelhança é mera coincidência (ou não) Curiosamente Ritchie Blackmore era fã de bossa nova...
Enfim, é isso, só mostrar que a coisa chegou no Brasil, ganhou novos contornos e muitas vezes voltou pra fora influenciando bandas pelo mundo...por isso é importante valorizar o que temos de cultura por aqui!
Caro Wagner, isso será mostrado, ainda que seus exemplos sejam muito enriquecedores para o debate e serão usados. Mas esse é o primeiro de 5 posts sobre rock, assim o rock da década de 1970 em diante será muito explorado. A ideia nesse primeiro momento é mostrar apenas como e qual rock foi ouvido pioneiramente no Brasil. Muito obrigado pela contribuição. Abraço.
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