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“Torna-se
indispensável manter o vigor do corpo, para conservar o do espírito.”
(Luc de Clapiers
Vauvenargues)
“A alma que abriga a
filosofia deve, para a sua saúde, tornar o corpo são.”
(Michel de Montaigne)
“A leitura da
realidade pelas práticas corporais permite fazer com que essas se tornem ‘chaves
de leitura do mundo’. As práticas corporais dos sujeitos passam a ser mais uma
linguagem, nem melhor nem pior do que as outras na leitura do real, apenas
diferente e com métodos e técnicas particulares.”
(Orientações
Curriculares do Ensino Médio – MEC)
:::A Educação física: novos paradigmas e velhas
práticas
A Educação Física é entendida como linguagem e disciplina na perspectiva de documentos oficiais como os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e as Orientações Curriculares para o Ensino Médio. Assim, esse saber e essa experiência passam oficial e publicamente a transcender a visão limitada de que ela corresponde ao mero lazer, momento de prática desportiva ou de competição, para ser - como os teóricos da área há tempos já preconizavam - um campo do conhecimento comprometido e responsável pela socialização dos alunos, por fomentar práticas saudáveis desde a ergonomia até a prevenção de doenças, também pode ser vista como uma disciplina capaz de ajudar a compreendermos melhor nosso corpo e as possibilidades de expressão dele. Evidentemente, também é função da Educação Física mediar o contato dos alunos com jogos, esportes, lutas, ginásticas e danças com o intuito de que eles desenvolvam habilidades corporais a partir disso, entretanto as dimensões culturais, afetivas, emocionais e psicológicas dessas atividades não podem ser ignoradas pelo trabalho dessa disciplina.
Historicamente, como
observado pelas Orientações Curriculares para o Ensino Médio, a Educação Física
serviu a muitos propósitos distantes ou confusos em relação à importância
significativa e fundamental dela na formação das pessoas. Eis algumas formas
citadas nesse documento de entendimento dessa disciplina ao longo do tempo no
Brasil.
“Diversos papéis
foram atribuídos à Educação Física na escola: preparação do corpo do aluno para
o mundo do trabalho; eugenização e assepsia do corpo, buscando uma ‘raça forte
e enérgica’; formação de atletas; terapia psicomotora; e até como instrumento
de disciplinarização e interdição do corpo.
Os alunos, por sua
vez, não deixaram de utilizar o tempo/espaço desse componente curricular de
diversas maneiras, tais como: relaxamento das tarefas demandadas por outras
disciplinas; tempo e espaço de encontro com os amigos; possibilidade de
realização de suas práticas de lazer; momento de ócio, etc.
Esses diversos usos
feitos pelos alunos (muitas vezes a despeito da figura do professor) também
estão carregados de valores, sentimentos, subjetividade. O entendimento que os
alunos têm de si mesmos; do seu corpo e do corpo dos outros; de seus valores e
posicionamentos éticos e estéticos; de seus projetos de vida pessoal e do lugar
que a escola ocupa nesses projetos: todas essas questões constroem o papel da
Educação Física e dos lugares que pode ocupar na vida dos alunos.” (Orientações
Curriculares do Ensino Médio, Brasil, MEC)
Para ilustrar e exemplificar as várias facetas da Educação Física em diversos setores e dimensões da sociedade, além da escola; seguem trechos dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e das Orientações Curriculares do Ensino Médio que são documentos produzidos pelo Ministério da Educação (MEC) do governo federal.
Para ilustrar e exemplificar as várias facetas da Educação Física em diversos setores e dimensões da sociedade, além da escola; seguem trechos dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e das Orientações Curriculares do Ensino Médio que são documentos produzidos pelo Ministério da Educação (MEC) do governo federal.
Expressão
e linguagem corporal na Educação Física.
Entende-se expressão corporal por movimento
do corpo motivado por razões utilitaristas ou pragmáticas, como são os casos do
desempenho corporal no trabalho ou em uma academia. Já linguagem corporal
sugere o movimento corporal como forma de linguagem não-verbal, um exemplo
disso é o movimento de um ator em um palco ou um espetáculo de balé clássico.
“Porém, as práticas
corporais possuem valores nelas mesmas, sem a necessidade de serem ‘traduzidas’
para outras linguagens para obter o seu reconhecimento. Estão diretamente ligadas
a uma formação estética, à sensibilidade dos alunos. Por meio do movimento
expressado pelas práticas corporais, os jovens retratam o mundo em que vivem:
seus valores culturais, sentimentos, preconceitos, etc. Também ‘escrevem’ nesse
mesmo mundo suas marcas culturais, construindo os lugares de moças e rapazes na
dinâmica cultural. Por vezes, acabam eles próprios se tornando ‘modelos
culturais’, nos quais uma certa ‘idéia de juventude’ passa a ser experimentada,
copiada e vivida também por outras gerações.
O diálogo das
práticas corporais realizadas com outras linguagens, disciplinas e métodos de
ensino deve respeitar as práticas corporais como sendo elas mesmas um conjunto
de saberes. Os saberes tratados na Educação Física nos remetem justamente a
pensar que existe uma variedade de formas de apreender e intervir na realidade
social que deve ser valorizada na escola numa perspectiva mais ampliada de
formação.” (Orientações
Curriculares do Ensino Médio, Brasil, MEC)
“Assim, a área de Educação Física hoje contempla
múltiplos conhecimentos produzidos e usufruídos pela sociedade a respeito do corpo e do
movimento. Entre eles, se consideram fundamentais as
atividades culturais de movimento com finalidades de lazer, expressão de
sentimentos, afetos e emoções, e com possibilidades de promoção, recuperação e
manutenção da saúde. Trata-se, então, de localizar em cada uma
dessas manifestações (jogo, esporte, dança, ginástica e luta) seus benefícios fisiológicos
e psicológicos e suas possibilidades de utilização como instrumentos de
comunicação, expressão, lazer e cultura, e formular a partir daí as propostas
para a Educação Física escolar.” (PCNs,
Brasil, MEC)
A
Educação Física: ginástica, esporte, jogos, lutas e dança como mediadores da
relação do indivíduo consigo mesmo, com o outro e com a sociedade
“Os conteúdos
Ginástica, Esporte, Jogos, Lutas e Dança como saberes construídos pela humanidade
podem ser palco de abordagem dos mais diferentes temas: gênero, práticas
corporais em espaços públicos, entre outros. Além disso, cada um desses
conteúdos possui uma vinculação social com a realidade atual, tal como a
vinculação do esporte à indústria cultural e à produção do espetáculo televisivo
e venda de produtos.” (Orientações Curriculares do Ensino Médio,
Brasil, MEC)
“A Ginástica e as Lutas possuem a riqueza das influências dos vários povos e culturas que construíram o Brasil. Estão ligadas a questões estéticas e às tradições da “boa condição física”. Carregam consigo o simbolismo da beleza corporal e o mito da longevidade, do corpo saudável e dos rituais de passagem presentes na história e nos modos de vida dos vários grupos étnicos.
“A Ginástica e as Lutas possuem a riqueza das influências dos vários povos e culturas que construíram o Brasil. Estão ligadas a questões estéticas e às tradições da “boa condição física”. Carregam consigo o simbolismo da beleza corporal e o mito da longevidade, do corpo saudável e dos rituais de passagem presentes na história e nos modos de vida dos vários grupos étnicos.
Os Jogos carreiam as
intenções lúdicas de cada prática corporal desenvolvida no campo das
transformações culturais. Quando se fala em possibilidades de práticas de
lazer, em processo criativo na escola ou em relações solidárias e diversidade cultural,
os Jogos, como conteúdo, representam a possibilidade da singularidade, do algo
descoberto, aquilo que representa a identidade dos grupos. Os traços da África,
da Europa e do índio estão presentes no despojamento corporal, desde os Jogos
dançantes até a simulação de combate, de festas religiosas, e nos ritos
sagrados de produção e sustentação da vida, como o plantio e a colheita. Os Jogos
são, ao mesmo tempo, tradição e consolidação de identidades, criação e transformação
permanentes; são a marca dos acordos coletivos.” (Orientações
Curriculares do Ensino Médio, Brasil, MEC)
“Esportivização”
da Educação Física: uma crítica
“Boa parte das críticas localizam-se em torno do fato de que o modelo de esportivização da Educação Física não possibilitou o alcance dos supostos objetivos colocados pelas políticas públicas de educação e esportes no Brasil. O Brasil não se tornou uma potência olímpica, não diminuiu suas largas diferenças sociais, não melhorou os níveis de saúde da população, não diminuiu o acesso dos jovens às drogas e não aumentou nem qualificou a contemplação da maioria passiva aos espetáculos de práticas corporais de qualquer natureza. As intenções em torno da esportivização dependiam sobretudo do desenvolvimento do esporte nacional. Com o tempo, a estrutura esportiva percebeu que a escola nunca seria o lugar adequado para a formação de quadro atlético suficiente e qualificado para acompanhar a evolução esportiva no mundo olímpico.
Por causa disso, as instituições esportivas criaram seus próprios espaços, o que revelou a verdadeira face do esporte como fenômeno social. Trata-se de uma mercadoria que precisa de trabalhadores e, como tal, seleciona, exige horas de trabalho disciplinado e, na maioria das vezes, tratando-se de sujeitos da classe trabalhadora, afasta-os da escola em nome da produtividade e da construção de uma falsa expectativa do sucesso para todos.
No contexto da esportivização não foram poucas as imposições de espaços de práticas corporais padronizados, produção de materiais de forma universal e homogênea, bem como a prescrição desses espaços e materiais como indispensáveis para a realização da prática esportiva. No bojo das circunstâncias, também as pessoas foram selecionadas e tratadas de forma impessoal, desconsiderando, entre outras coisas, a pluralidade de corpos que é produzida na pluralidade de culturas. Mulheres e homens foram reconhecidos pelo biotipo, pelas supostas existências de determinadas estruturas musculares diferenciadas e pela capacidade de “adaptação” aos treinamentos e às particularidades das atividades ensinadas. Teses racistas, sexistas, elitistas e excludentes sobressaíram nesses processos de seleção humana, discriminatória e segregadora de um enorme contingente de jovens.
Admitir o modelo da esportivização como método e princípio orientador do trabalho pedagógico na escola e persistir nele é, sem dúvida, viver em meio a uma grande contradição nos dias de hoje. Se a sociedade rejeita o trabalho infantil precoce e a exposição do jovem a situações humilhantes e desumanas, a escola não pode aceitar uma relação que sustenta um discurso carregado de mitos e símbolos que afasta o jovem dos estudos regulares e o coloca em um campo de trabalho semi-escravo, a partir de falsas promessas de sucesso.” (Orientações Curriculares do Ensino Médio, Brasil, MEC)
“Outro foco das críticas da produção acadêmica centra-se no distanciamento que o modelo de esportivização causou entre a Educação Física e a escola em sua totalidade. O modelo foi aplicado como se a Educação Física pudesse ocupar um espaço à parte na estrutura escolar.
O binômio aluno–atleta foi uma constante no tratamento dado àqueles poucos selecionados à revelia do funcionamento normal da escola. O corpo docente também experimentou a mistura de papéis entre professor e treinador e, com o advento das produções críticas, o olhar para o interior da escola e a aproximação maior dos temas e das grandes questões escolares em comum tornou-se uma necessidade para a Educação Física escolar.” (Orientações Curriculares do Ensino Médio, Brasil, MEC)
“Boa parte das críticas localizam-se em torno do fato de que o modelo de esportivização da Educação Física não possibilitou o alcance dos supostos objetivos colocados pelas políticas públicas de educação e esportes no Brasil. O Brasil não se tornou uma potência olímpica, não diminuiu suas largas diferenças sociais, não melhorou os níveis de saúde da população, não diminuiu o acesso dos jovens às drogas e não aumentou nem qualificou a contemplação da maioria passiva aos espetáculos de práticas corporais de qualquer natureza. As intenções em torno da esportivização dependiam sobretudo do desenvolvimento do esporte nacional. Com o tempo, a estrutura esportiva percebeu que a escola nunca seria o lugar adequado para a formação de quadro atlético suficiente e qualificado para acompanhar a evolução esportiva no mundo olímpico.
Por causa disso, as instituições esportivas criaram seus próprios espaços, o que revelou a verdadeira face do esporte como fenômeno social. Trata-se de uma mercadoria que precisa de trabalhadores e, como tal, seleciona, exige horas de trabalho disciplinado e, na maioria das vezes, tratando-se de sujeitos da classe trabalhadora, afasta-os da escola em nome da produtividade e da construção de uma falsa expectativa do sucesso para todos.
No contexto da esportivização não foram poucas as imposições de espaços de práticas corporais padronizados, produção de materiais de forma universal e homogênea, bem como a prescrição desses espaços e materiais como indispensáveis para a realização da prática esportiva. No bojo das circunstâncias, também as pessoas foram selecionadas e tratadas de forma impessoal, desconsiderando, entre outras coisas, a pluralidade de corpos que é produzida na pluralidade de culturas. Mulheres e homens foram reconhecidos pelo biotipo, pelas supostas existências de determinadas estruturas musculares diferenciadas e pela capacidade de “adaptação” aos treinamentos e às particularidades das atividades ensinadas. Teses racistas, sexistas, elitistas e excludentes sobressaíram nesses processos de seleção humana, discriminatória e segregadora de um enorme contingente de jovens.
Admitir o modelo da esportivização como método e princípio orientador do trabalho pedagógico na escola e persistir nele é, sem dúvida, viver em meio a uma grande contradição nos dias de hoje. Se a sociedade rejeita o trabalho infantil precoce e a exposição do jovem a situações humilhantes e desumanas, a escola não pode aceitar uma relação que sustenta um discurso carregado de mitos e símbolos que afasta o jovem dos estudos regulares e o coloca em um campo de trabalho semi-escravo, a partir de falsas promessas de sucesso.” (Orientações Curriculares do Ensino Médio, Brasil, MEC)
“Outro foco das críticas da produção acadêmica centra-se no distanciamento que o modelo de esportivização causou entre a Educação Física e a escola em sua totalidade. O modelo foi aplicado como se a Educação Física pudesse ocupar um espaço à parte na estrutura escolar.
O binômio aluno–atleta foi uma constante no tratamento dado àqueles poucos selecionados à revelia do funcionamento normal da escola. O corpo docente também experimentou a mistura de papéis entre professor e treinador e, com o advento das produções críticas, o olhar para o interior da escola e a aproximação maior dos temas e das grandes questões escolares em comum tornou-se uma necessidade para a Educação Física escolar.” (Orientações Curriculares do Ensino Médio, Brasil, MEC)
Esporte
e lazer como direitos do cidadão e como prática da “cultura corporal do
movimento”
“O lazer e a disponibilidade de espaços para
atividades lúdicas e esportivas são necessidades básicas e, por isso, direitos
do cidadão. Os alunos podem compreender que os esportes e as demais atividades
corporais não devem ser privilégio apenas dos esportistas ou das pessoas em
condições de pagar por academias e clubes. Dar valor a essas atividades e
reivindicar o acesso a elas para todos é um posicionamento que pode ser adotado
a partir dos conhecimentos adquiridos nas aulas de Educação Física.” (PCNs, Brasil, MEC)
“Ensinar e aprender a cultura corporal de
movimento envolve a discussão permanente dos direitos e deveres do cidadão em
relação às possibilidades de exercício do lazer, da interação social e da
promoção da saúde. Envolve, portanto, também o ensino de formas de organização
para a reivindicação junto aos poderes públicos de equipamentos, espaços e
infra-estrutura para a prática de atividades” (PCNs, Brasil, MEC)
O corpo
como objeto de estudo e análise
“O corpo é compreendido como um organismo
integrado e não como um amontoado de ‘partes’ e ‘aparelhos’, como um corpo
vivo, que interage com o meio físico e cultural, que sente dor, prazer,
alegria, medo, etc. Para se conhecer o corpo abordam-se os conhecimentos anatômicos,
fisiológicos, biomecânicos e bioquímicos que capacitam a análise crítica dos
programas de atividade física e o estabelecimento de critérios para julgamento,
escolha e realização que regulem as próprias atividades corporais saudáveis,
seja no trabalho ou no lazer. São tratados de maneira simplificada,
abordando-se apenas os conhecimentos básicos.” (PCNs, Brasil, MEC)
Razões
pragmáticas e formalistas do desempenho (“performance”) corporal no trabalho e
no lazer
“Entre essas possibilidades e necessidades
podem-se incluir motivos militares, relativos ao domínio e ao uso de espaço;
motivos econômicos, que dizem respeito às tecnologias de caça, pesca e agricultura;
motivos de saúde, pelas práticas compensatórias e profiláticas. Podem-se
incluir, ainda, motivos religiosos, no que se referem aos rituais e festas;
motivos artísticos, ligados à construção e à expressão de idéias e sentimentos;
e por motivações lúdicas, relacionadas ao lazer e ao divertimento. Algumas
práticas com motivos de caráter utilitário relacionam-se mais diretamente à
realidade objetiva com suas exigências de sobrevivência, adaptação ao meio,
produção de bens, resolução de problemas e, nesse sentido, são conceitualmente
mais próximas do trabalho. Outras, com motivos de caráter eminentemente
subjetivo e simbólico, são realizadas com fim em si mesmas, por prazer e
divertimento. Estão mais próximas do lazer e da fantasia, embora suas origens,
em muitos casos, estejam em práticas utilitárias. Por exemplo, a prática do
remo, da caça e da pesca por lazer e não por sobrevivência, o caminhar como
passeio e o correr como competição e não como forma de locomoção. Assim, às atividades
desse segundo agrupamento pode-se atribuir o conceito de atividade lúdica, de
certo modo diferenciada do trabalho.” (PCNs, Brasil, MEC)
Educação
Física, meios de comunicação e possibilidades interdisciplinares
“No âmbito da Educação Física, os
conhecimentos construídos devem possibilitar a análise crítica dos valores
sociais, como os padrões de beleza e saúde, desempenho, competição exacerbada,
que se tornaram dominantes na sociedade, e do seu papel como instrumento de
exclusão e discriminação social. A atuação dos meios de comunicação e da
indústria do lazer em produzir, transmitir e impor esses valores, ao adotar o
esporte-espetáculo como produto de consumo, torna imprescindível a atuação da
Educação Física escolar. Esta deve fornecer informações políticas, históricas e
sociais que possibilitem a análise crítica da violência, dos interesses
políticos e econômicos, do doping, dos sorteios e loterias, entre outros
aspectos. O vínculo direto que a indústria cultural e do lazer estabelece entre
o acesso aos conhecimentos da cultura corporal de movimento e o consumo de
produtos deve ser alvo de esclarecimento e reflexão.” (PCNs, Brasil, MEC)
“A prática de jogos, esportes, lutas, danças
e ginásticas é considerada, no senso comum, como sinônimo de saúde. Essa
relação direta de causa e efeito linear e incondicional é explorada e
estimulada pela indústria cultural, do lazer e da saúde ao reforçar conceitos e
cultivar valores, no mínimo questionáveis, de dieta, forma física e modelos de
corpo ideais. Atrelada a essas premissas inevitavelmente carregadas de valores
ideológicos e a interesses econômicos, a prática da atividade física é
vinculada diretamente ao consumo de bens e de serviços (equipamentos,
academias, espaços de lazer, complementos alimentares, prescrições de
treinamento), citada como método infalível no combate ao uso abusivo de álcool,
fumo e drogas, e como recurso de integração social do jovem e do adolescente” (PCNs, Brasil, MEC)
“Além disso, deve-se ressaltar que grande
parte das informações conceituais disponíveis no ambiente sociocultural
relativas às práticas da cultura corporal de movimento dizem respeito ao exercício
profissional dessas atividades, com enfoques e valores muitas vezes
contraditórios que contribuem para a construção tanto de uma imagem distorcida
do exercício profissional de esportes, lutas, danças e ginástica, como numa
referência equivocada para o cotidiano do cidadão comum. Considerando a força
que a cultura de massa consegue imprimir na constituição/geração de modelos de comportamentos
e atitudes, resultam dessas distorções, por exemplo no plano institucional, a manipulação
demagógica de poderes públicos, na prestação de serviços de lazer e programas
de atividade física, e o uso de instituições públicas de pesquisa na geração de
tecnologia e conhecimento a serem utilizados pelo setor privado. No plano
pessoal, da vida cotidiana do cidadão, abre-se um espaço que favorece os
modismos, o consumismo exacerbado ou a impossibilidade de acesso, a anorexia
entre adolescentes, a exclusão calcada em estereótipos e padrões corporais, no
comércio clandestino de anabolizantes, entre outros. Nesse sentido, para além
do suporte de informações de caráter científico e cultural, é responsabilidade
da Educação Física escolar diversificar, desmistificar, contextualizar, e, principalmente,
relativizar valores e conceitos da cultura corporal de movimento. Assim, o
aprendizado das relações entre a prática de atividades corporais e a
recuperação, manutenção e promoção da saúde deve incluir o sujeito e sua
experiência pessoal ao considerar os benefícios, os riscos, as indicações e as contra-indicações
das diferentes práticas da cultura corporal de movimento e as medidas de
segurança no seu exercício. O cotidiano postural, o tipo de trabalho físico
exercido, os hábitos de alimentação, sono, lazer e interação social, o
histórico pessoal de relações com as atividades corporais constituem um sujeito
real que deve ser considerado na formulação de qualquer programa de saúde que
envolva atividade física” (PCNs,
Brasil, MEC)
“Principalmente nas zonas urbanas, as atuais
condições socioeconômicas, como o desemprego crescente, a informatização e
automatização do trabalho, a urbanização descontrolada e o consumismo, favorecem
a formação de um ambiente em que o cidadão convive com a poluição, a violência,
a deterioração dos espaços públicos de lazer e a falta de tempo para a
atividade física e convívio social. Esse contexto contribui para a geração de
um estilo de vida caracterizado pelo sedentarismo, pelo estresse e pela
alimentação inadequada, resultando num crescente aumento de mortes por doenças cardiovasculares.
Essa situação, somada à falta de infra-estrutura pública para atividades
corporais, transforma as horas diante da televisão em uma das poucas opções de lazer
para a maioria da população, especialmente para crianças e adolescentes, o que
leva à diminuição da atividade motora, ao abandono da cultura de jogos infantis
e à substituição da experiência de praticar atividades pela de assistir
passivamente às práticas da cultura corporal de movimento” (PCNs, Brasil, MEC)
“A cultura corporal de movimento se
caracteriza, entre outras coisas, pela diversidade de práticas, manifestações e
modalidades de cultivo. Trata-se de um espectro tão amplo e complexo, que é
quase impossível sistematizá-lo conceitualmente de forma abrangente. De
qualquer forma, é esse universo de informações que chega ao jovem e ao
adolescente da mídia, de forma sedutora, fragmentada, manipulada por interesses
econômicos e por valores ideológicos. Dessa realidade a Educação Física escolar
não pode fugir nem alienar-se, pois é impossível negar a força que a indústria
da cultura e do lazer exerce na geração de comportamentos e atitudes” (PCNs, Brasil, MEC)
Educação
Física, cultura popular e resgate cultural
“Na escola, a Educação Física pode fazer um
trabalho de pesquisa e cultivo de brincadeiras, jogos, lutas e danças
produzidos na cultura popular, que por diversas razões correm o risco de ser
esquecidos ou marginalizados pela sociedade. Pesquisar informações sobre essas
práticas na comunidade e incorporá-las ao cotidiano escolar, criando espaços de
exercício, registro, divulgação e desenvolvimento dessas manifestações,
possibilita ampliar o espectro de conhecimentos sobre a cultura corporal de
movimento. Dessa forma, a construção de brinquedos, a prática de brincadeiras
de rua dentro da escola, a inclusão de danças populares de forma sistemática -
e não apenas eventual - nas festas e comemorações contribuem para a construção
de efetivas opções de exercício de lazer cultural e para o diálogo entre a
produção cultural da comunidade e da escola. A intensa veiculação pela mídia e
o caráter quase universal de determinadas modalidades esportivas, como o
futebol, o vôlei, o basquete, o boxe e o atletismo, permitem a apreciação e a
comparação de estilos e maneiras de praticá-las, relacionando-as a diversos
grupos sociais e culturais. No caso da dança, é possível questionar as
distorções decorrentes da massificação, da banalização e do caráter competitivo
impostos pela indústria do lazer e do turismo, em manifestações como
o samba e a capoeira, por exemplo” (PCNs, Brasil, MEC)
Educação
Física, ecologia e sustentabilidade
“Na sociedade contemporânea assiste-se ao
cultivo de atividades corporais praticadas em ambientes abertos e próximos da
natureza. São exemplos dessa valorização o surfe, o alpinismo, o bicecross, o
jet-ski, entre os esportes radicais; e o montanhismo, as caminhadas, o mergulho
e a exploração de cavernas, entre as atividades de lazer ecológico. Se por um
lado é possível perceber nessas práticas uma busca de proximidade com o
ambiente natural, também é necessário estar atento para as conseqüências da poluição
sonora, visual e ambiental que essas atividades podem causar. As características
básicas de algumas dessas modalidades, como o individualismo, a busca da emoção
violenta (adrenalina), a necessidade de equipamentos sofisticados e caros,
devem ser discutidas e compreendidas no contexto da indústria do lazer. Ou
seja, é ingênuo pensar que apenas a prática de atividades junto à natureza, por
si só, é suficiente para a compreensão das questões ambientais emergentes.
Embora possa existir, entre os adeptos dessas modalidades, o envolvimento com
as questões ambientais, o que determinará o nível reflexivo sobre uma ou outra
questão ambiental é a reflexão crítica e atenta realizada pelos praticantes de
cada atividade.” (PCNs,
Brasil, MEC)
Educação
Física como interlocutora entre a escola e o restante da sociedade
“No entanto, a Educação Física e a escola de
maneira geral não precisam confinar-se em seus muros. O diálogo permanente com
a comunidade próxima pode ser cultivado franqueando espaço para o desenvolvimento
de produções relativas ao lazer, à expressão e à promoção da saúde, assim como ultrapassando
os muros escolares na busca de informações e produções desta natureza. A escola
pode buscar na comunidade pessoas e instituições que dominem conhecimentos relativos
a práticas da cultura corporal e trazê-las para o seu interior. Academias de
capoeira, escolas de samba, grupos de danças populares, sindicatos e
associações de classe que cultivem práticas esportivas são freqüentados pelos próprios
alunos e podem estabelecer um diálogo permanente com a instituição escolar” (PCNs, Brasil, MEC)
Educação
Física, currículo e multiculturalismo
“O currículo escolar
não pode ser considerado algo dado, natural, como se sempre existisse da mesma
forma. Currículo escolar é sempre fruto de escolha e de silenciamentos, ou
seja, fruto de uma intenção. É impossível a qualquer escola dar conta da
totalidade dos conhecimentos e dos saberes construídos pela humanidade.
O tratamento de
qualquer saber na escola é um processo de seleção cultural, de um recorte de
quais aspectos da cultura trataremos junto com os alunos, o que vai ser
explicitado ou não nos nossos processos de formação. Esse processo de
escolha/seleção nunca foi simples. É intencional e político e, como tal, é
sempre resultado de conflitos e lutas de poder realizados pelos atores dentro e
fora da escola. Longe de um simples consenso, currículo é campo de luta: luta
por quais saberes, valores e formas de socialização farão parte da vida dos
alunos.
Um exemplo
emblemático dessas escolhas e desses silenciamentos ocorre no campo das
relações étnico e raciais. A forma de tratar ou de ocultar temas como a
escravatura, o racismo e as desigualdades que ainda persistem nas relações
étnicos e raciais espelha o posicionamento político que a escola tem dessas
questões.
No caso específico da
Educação Física, não são poucos os casos de um currículo escolar que privilegie
apenas as práticas corporais de origem européia ou norte-americana, notadamente
os esportes. Ao escolher abordar ou não práticas corporais oriundas da cultura
afro-brasileira (como a capoeira, os maracatus, etc.), bem como a forma como
elas aparecem na escola, aponta-se para um conjunto de escolhas curriculares e
políticas de como essas relações são tratadas no meio escolar.
As escolhas/seleções
das culturas feitas pelo currículo (sempre político) afetam diretamente a todos
na escola das mais diferentes formas. Cultura aqui entendida como as práticas
em seu aspecto aparente, visível, mas também como sendo o conjunto de significados
atribuídos a essas práticas. Dessa forma, tão importante quanto a decisão de se
ensinar ou não um determinado esporte, dança, jogo, etc. é pensar que sentidos
e significados são atribuídos a esse esporte, dança ou jogo pelos alunos nas
aulas de Educação Física. Que significados culturais estão presentes em um jogo
de futebol? Em um jogo de bocha? Em uma brincadeira de roda? Em uma dança de
rua? O tratamento pedagógico dado a essas e a outras questões da cultura se
reflete diretamente nas possibilidades de formação dos alunos e dos
professores.” (Orientações
Curriculares do Ensino Médio, Brasil, MEC)
Abaixo,
um resumo das responsabilidades atribuídas à Educação Física pelos PCNs e pelas
Orientações Educacionais do Ensino Médio, publicados pelo MEC:
·
garantir
o direito de todos os alunos, sem exceção, terem acesso aos conhecimentos produzidos
culturalmente e que se manifestam nas diferentes práticas corporais;
·
possibilitar
a compreensão dos alunos quanto à natureza social e cultural dessas práticas;
·
problematizar
a construção cultural das práticas corporais, bem como o questionamento dos
valores e dos padrões usualmente a elas vinculados;
·
situar
os alunos como sujeitos produtores de cultura, viabilizando condições para que
se apropriem dessas práticas, vivenciando-as e recriando-as tanto na forma como
nos sentidos e valores a elas atribuídos, com base em seus próprios interesses;
·
propiciar
condições para que o aluno compreenda que brincadeira e jogo, entendidos como
direitos sociais, refletem a produção de saberes e conhecimentos;
·
garantir
a participação irrestrita de todos em todas as práticas possíveis, independentemente
de suas qualificações prévias ou aptidões físicas e desportivas;
·
desmitificar
o discurso acerca da virilidade masculina e da fragilidade feminina quanto às
capacidades e habilidades físicas, proporcionando aos grupos vivências
corporais e debates sobre valores morais e étnicos de cunho sexista;
·
superar
na relação pedagógica a idéia de que as diferenças entre homens e mulheres são
apenas biológicas. Os corpos feminino e masculino, assim como a subjetividade
de homens e mulheres, constituem-se a partir de relações sociais, construídas
ao longo da história;
·
desmitificar
o discurso da ascensão sócio-econômica fácil, que acaba afastando muitos jovens
da escola e da cultura juvenil em direção ao fascínio que o mundo do espetáculo
da competição exerce por meio da mídia;
·
desmitificar
o discurso do combate à marginalização social por meio da Educação Física,
questionando a idéia de que o exercício de práticas corporais sistematizadas,
controladas por professores e instituição escolar, é um antídoto para grandes
males que assolam a sociedade moderna, tais como: consumo de drogas,
criminalidade urbana, gravidez precoce, entre outros. As práticas corporais
precisam ser tratadas como direito social de vivência e produção de cultura, e
não como “prêmio”, “castigo” ou “remédio” para “corrigir” os jovens das camadas
populares;
·
valorizar
outras práticas corporais oriundas dos diversos grupos étnicos que constituem a
sociedade brasileira.
Portanto, em
linhas gerais, são deveres fundamentais da disciplina de Educação Física no
Ensino Médio segundo as Orientações Curriculares divulgadas pelo MEC em relação
à formação dos alunos:
- formação cultural no que tange a oportunidade de vivência das práticas corporais;
- participação
efetiva no mundo do trabalho no que se refere à compreensão do papel do corpo no mundo da produção, no que
remete ao controle sobre o próprio
esforço e do direito ao repouso e ao lazer;
- iniciativa
pessoal nas articulações coletivas relativas às práticas corporais comunitárias;
- iniciativa
pessoal para criar, planejar ou buscar orientação para suas próprias práticas
corporais;
- intervenção política sobre as iniciativas públicas de esporte, lazer e organização da comunidade nas manifestações, vivência e na produção de cultura.
Fico grato à disponibilização do conteúdo.
ResponderExcluirUm detalhe : notei que os 2 primeiros parágrafos do subtítulo Esporte e lazer como direitos do cidadão e como prática da “cultura corporal do movimento” são repetidos.
Eu que agradeço a sugestão de correção do erro, já corrigido. Muito obrigado pela atenção. Saudações.
ResponderExcluir