quarta-feira, 30 de maio de 2012

Charges sobre a crise econômica - humor possível

El País, 25/5/10


Mais charges, clique abaixo.

Olhares cinematográficos sobre a crise econômica


http://exame.abril.com.br/economia/noticias/8-filmes-para-entender-a-crise-economica-mundial?p=1#link

Proposta 2012-15 - Uberaba - todas as turmas (entrega - 14-06-2012)

FGV (adaptada)




Como atestam as manchetes e charges acima, a crise econômica iniciada em 2008 afetou o mundo inteiro e parece que ninguém vai escapar dela. Mas as crises econômicas costumam nos ensinar alguma coisa. Passamos a agir com mais comedimento e acabamos por adiar projetos que envolvam dinheiro, tais como fazer uma viagem, reformar a casa, trocar de carro. É nessas horas que alguém pode se fazer perguntas e concluir que alguns bens materiais não são tão necessários assim. Aquela bolsa de grife poderia muito bem ser substituída por outra, aquele relógio de marca foi uma ostentação inútil. Pode ser que alguém, refletindo um pouco mais, perceba que , para se viver bem, deve-se estancar essa insaciável busca de bens materiais e optar por um estilo de vida mais simples. Afinal, por vezes, são pequenas coisas que nos deixam felizes. Os filósofos bem que nos ensinam o que realmente na vida tem valor: aproveitar o presente, deixar a arrogância de lado e não perder de vista a brevidade da vida. Sêneca, por exemplo, filósofo romano, escreveu que não era na riqueza e nos prazeres mundanos que estava a felicidade. Enquanto as pessoas fossem escravas de seus desejos, não poderiam almejar a paz de espírito, nem a felicidade. Esta só seria alcançada por aqueles que possuíssem um caráter forte e fosse senhor de sua própria existência.

Reflita sobre as informações contidas nos textos e elabore uma dissertação sobre o tema:

A CRISE ECONÔMICA COMO OPORTUNIDADE PARA SE REPENSAREM OS VALORES.

Instruções:
• Na redação, deverão ser observadas as normas da língua padrão.
• Sua redação será anulada, se você fugir do tema proposto ou não respeitar a modalidade de texto solicitada (dissertação).

domingo, 27 de maio de 2012

Sobre listas que impressionam, mas devem ser analisadas com cuidado

ÉPOCA – Blog do Planeta | O meio ambiente que você faz » Qual país causa mais dano ao planeta? » Arquivo:

'via Blog this'

Gêneros textuais - crônica

Um ótimo exemplo de crônica, além disso e mais importante, um olhar leve e honesto sobre a fama e sobre o submundo das aparências.

http://colunas.revistaepoca.globo.com/brunoastuto/2012/05/27/o-tapete-vermelho-e-um-mafua/

Atualidades - 2012 - EM e PV - Lista 14

Caras e caros,

Boa tarde, eis a nova lista com enfoque para os vetos da presidente Dilma para o Código Florestal. Leiam com atenção também a entrevista sobre os desdobramentos da crise econômica e política grega.

Abraços e boa leitura,

Professor Estéfani Martins
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Proposta 2012-14 - Uberaba - todas as turmas (entrega - 31-05-2012)


Simulado UFU


Clique abaixo para mais ler as propostas.



terça-feira, 15 de maio de 2012

Proposta 2012-13 - Uberaba - todas as turmas (entrega - 24-05-2012)


Leia atentamente os textos abaixo e sigas as instruções abaixo:

Texto 1

Violência contra a mulher

Na esfera jurídica, violência significa uma espécie de coação, ou forma de constrangimento, posto em prática para vencer a capacidade de resistência de outrem, ou a levar a executá-lo, mesmo contra a sua vontade. É igualmente, ato de força exercido contra as coisas, na intenção de violentá-las, devassá-las, ou delas se apossar.
Existem vários tipos de armas utilizadas na violência contra a mulher, como: a lesão corporal, que é a agressão física, como socos, pontapés, bofetões, entre outros; o estupro ou violência carnal, sendo todo atentado contra o pudor de pessoa de outro sexo, por meio de força física, ou grave ameaça, com a intenção de satisfazer nela desejos lascivos, ou atos de luxúria; ameaça de morte ou qualquer outro mal, feitas por gestos, palavras ou por escrito; abandono material, quando o homem, não reconhece a paternidade, obrigando assim a mulher, entrar com uma ação de investigação de paternidade, para poder receber pensão alimentícia.
Mas nem todos deixam marcas físicas, como as ofensas verbais e morais, que causam dores,que superam, a dor física. Humilhações, torturas, abandono, etc, são considerados pequenos assassinatos diários, difíceis de superar e praticamente impossíveis de prevenir, fazendo com que as mulheres percam a referencia de cidadania.
A violência contra a mulher, não esta restrita a um certo meio, não escolhendo raça, idade ou condição social. A grande diferença é que entre as pessoas de maior poder financeiro, as mulheres, acabam se calando contra a violência recebida por elas, talvez por medo, vergonha ou até mesmo por dependência financeira. (...)

http://www.portaldafamilia.org/artigos/artigo323.shtml

Texto 2



Texto 3

Levantamento revela permanência da violência contra mulher mesmo após a Lei Maria da Penha

Brasília – A nova edição do Mapa da Violência mostra um problema antigo: em trinta anos a taxa de homicídios de mulheres no Brasil oscilou em torno de 4,4 vítimas a cada 100 mil mulheres. Foram assassinadas, entre 1980 e 2010, 91.932 mulheres. Quase a metade dos casos, 43.486 mortes, ocorreu na última década.
Segundo o documento, até os 14 anos de idade os pais são os principais responsáveis pela violência. O papel de agressor, porém, vai sendo substituído progressivamente pelo parceiro ou ex-parceiro, a partir dos 20 anos de idade, situação que se mantém até a idade de 60 anos. Depois dos 60 anos os filhos preponderam na geração de violência contra a mulher.
Em vigor, desde 2006, a Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340) criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra as mulheres. Segundo o sociólogo Júlio Jacobo, autor do Mapa da Violência, os indicadores de violência estagnaram desde a mudança da legislação. “Não está aumentando, mas ainda estamos ainda na UTI, mesmo sem o agravamento do quadro”, explicou o pesquisador à Agência Brasil.
“A Lei Maria da Penha atua na contramão de um processo histórico de violência, mas nenhuma lei altera a realidade”, avalia Jacobo. Segundo ele, a mobilização da sociedade civil e o funcionamento do Poder Público contribuem também para a eficácia da lei. No segundo semestre, a Secretaria de Política para as Mulheres, ligada à Presidência da República, deverá propor um “pacto nacional” para enfrentamento da violência contra a mulher.
A violência contra as mulheres faz do Brasil o sétimo em “feminicídio” num ranking de 84 países, atrás de El Salvador, da Guatemala, Rússia e Colômbia. Internamente, os estados com as taxas mais elevadas de violência contra as mulheres são o Espírito Santo, Alagoas e o Paraná, respectivamente com taxas de 9,4, 8,3 e 6,3 homicídios para cada 100 mil mulheres. Dentre as capitais, as maiores taxas estão na Região Norte: Porto Velho, Rio Branco e Manaus.
O levantamento foi feito com base em dados secundários, obtidos do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM) e do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) – ambos do Ministério da Saúde. Para os dados internacionais, Jacobo utilizou o Sistema de Informações Estatísticas da Organização Mundial da Saúde (Whosis, sigla em inglês).


Proposta de redação A - Dissertação (UFTM, USP, Unesp, etc.)

Redija um texto em prosa, do tipo dissertativo-argumentativo, respondendo à seguinte questão:

Por que, apesar de todas as conquistas sociais das mulheres, elas continuam sendo alvo tão frequente de violência, em especial, a doméstica?

Observações gerais:
- A redação deverá ter entre 25 e 30 linhas.
- Dê um título a sua redação.

Proposta de redação B - Editorial (UFU, Unicamp, etc.)

Após ler os textos acima, faça um editorial a ser publicado em jornal de grande circulação em que se proponham medidas de combate a esse problema que aflige tantas mulheres no Brasil.

Orientações gerais
- Escreva seu texto com tinta azul;
- Seu texto deve conter de 25 a 30 linhas.

Atualidades - 2012 - EM e PV - Lista 13

Caras e caros,

Nesta semana, além dos habituais textos retirados de diversas publicações que representam assuntos importantes não só para os vestibulares, mas também para a formação de todos nós. Entretanto, destaco o texto retirado do “site” da revista Época em que uma psicóloga brasileira - membro da ONG Médico sem Fronteiras – descreve suas experiências em missões humanitárias de uma forma não só impressionante pelas suas experiências humanas extraordinárias, como também pela maneira como ela as encara.

Abraços e boa leitura,

Professor Estéfani Martins
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Simulados do Enem e da Fuvest gratuitos

http://vestibular.uol.com.br/ultimas-noticias/2012/05/15/uol-montou-simulados-com-100-questoes-da-fuvest-e-do-enem-faca-as-provas-online.jhtm

NCA - 1°ano - Saúde e tecnologia

Novas doenças de um novo mundo:

http://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/1090127-tecnoestresse-causa-ansiedade-e-depressao-em-jovens.shtml

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Uberlândia - Ensino Médio - 2º bimestre - 2º e 3º anos - Matérias do simulado Enem

A material dos simulados para segundos e terceiros anos é cumulativa, portanto podem ser exigidos os assuntos discutidos até aqui em nossas aulas, a saber:

- Arte Pré-Histórica
- Arte Egípcia
- Arte Grega 
- Arte Romana
- Arte Islâmica
- Arte Medieval (Bizantina, Românica e Gótica)
- Arte Renascentista

Uberlândia - Ensino Médio - 2º bimestre - Matérias para a P3 e P3(rec)


2º e 3º ano regulares

- ATA -  Arte Medieval e Renascença

1º ano integral

- NCA - Propriedade intelectual
- CineDebate - "Lixo Extraordinário"
- Atualidades - Lista 12

2º e 3º ano integrais

- ATA - Arte Medieval e Renascença
- CineDebate - "Gattaca" (3º ano) e "A Onda" (2º ano)
- Atualidades - Lista 12

Gêneros textuais: obituário

Obituário é o informe a respeito da morte de um indivíduo em particular em que se aborda, brevemente, os feitos, talentos e legados da vida que se extinguiu, na maioria dos casos apenas comunica-se filiação e laços familiares, além de nome completo, idade e lugar onde será cremado ou enterrado. No caso de personalidades famosas, os obituários são muitas vezes escritos com um toque literário, não raro com certa generosidade. Neles narra-se a vida e as principais realizações do falecido (a). Normalmente, pode ser publicado em jornais como: comunicado, anúncio pago ou na seção de utilidade pública.

Mais no link abaixo

NCA - 1º ano - Guia de posturas em redes sociais (P2 - 2º bimestre)



NCA - 1º ano - O acesso à informação, a propriedade intelectual e produção de conteúdo no Brasil (P3 - 2º bimestre)

http://www.cgu.gov.br/acessoainformacaogov/acesso-informacao-brasil/legislacao-integra.asp

http://www.museu-goeldi.br/institucional/i_prop_propintel.htm

http://www.ufmg.br/pfufmg/index.php/pagina-inicial/saiba-direito/220-voce-sabe-o-que-e-propriedade-intelectual

http://tecnologia.terra.com.br/noticias/0,,OI5727610-EI12884,00-Ministra+defende+regulacao+de+propriedade+intelectual+na+internet.html

http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/propriedade_intelectual_na_internet_um_direito_incompreendido

NCA - 1º ano - Duas pesquisas sobre redes sociais

http://comunicadores.info/2011/07/20/o-jovem-e-as-redes-sociais/

http://www.slideshare.net/eCMetricsBrasil/perfil-dobrasileironasmidiassociais-6906660

sábado, 12 de maio de 2012

Gêneros textuais: conto


Casa Tomada
(Júlio Cortázar)


       Gostávamos da casa porque, além de ser espaçosa e antiga (as casas antigas de hoje sucumbem às mais vantajosas liquidações dos seus materiais), guardava as lembranças de nossos bisavós, do avô paterno, de nossos pais e de toda a nossa infância. Acostumamo-nos Irene e eu a persistir sozinhos nela, o que era uma loucura, pois nessa casa poderiam viver oito pessoas sem se estorvarem. Fazíamos a limpeza pela manhã, levantando-nos às sete horas, e, por volta das onze horas, eu deixava para Irene os últimos quartos para repassar e ia para a cozinha. O almoço era ao meio-dia, sempre pontualmente; já que nada ficava por fazer, a não ser alguns pratos sujos. Gostávamos de almoçar pensando na casa profunda e silenciosa e em como conseguíamos mantê-la limpa. Às vezes chegávamos a pensar que fora ela a que não nos deixou casar. Irene dispensou dois pretendentes sem motivos maiores, eu perdi Maria Esther pouco antes do nosso noivado. Entramos na casa dos quarenta anos com a inexpressada idéia de que o nosso simples e silencioso casamento de irmãos era uma necessária clausura da genealogia assentada por nossos bisavós na nossa casa. Ali morreríamos algum dia, preguiçosos e toscos primos ficariam com a casa e a mandariam derrubar para enriquecer com o terreno e os tijolos; ou melhor, nós mesmos a derrubaríamos com toda justiça, antes que fosse tarde demais.Irene era uma jovem nascida para não incomodar ninguém. Fora sua atividade matinal, ela passava o resto do dia tricotando no sofá do seu quarto. Não sei por que tricotava tanto, eu penso que as mulheres tricotam quando consideram que essa tarefa é um pretexto para não fazerem nada. Irene não era assim, tricotava coisas sempre necessárias, casacos para o inverno, meias para mim, xales e coletes para ela. Às vezes tricotava um colete e depois o desfazia num instante porque alguma coisa lhe desagradava; era engraçado ver na cestinha aquele monte de lã encrespada resistindo a perder sua forma anterior. Aos sábados eu ia ao centro para comprar lã; Irene confiava no meu bom gosto, sentia prazer com as cores e jamais tive que devolver as madeixas. Eu aproveitava essas saídas para dar uma volta pelas livrarias e perguntar em vão se havia novidades de literatura francesa. Desde 1939 não chegava nada valioso na Argentina. Mas é da casa que me interessa falar, da casa e de Irene, porque eu não tenho nenhuma importância. Pergunto-me o que teria feito Irene sem o tricô. A gente pode reler um livro, mas quando um casaco está terminado não se pode repetir sem escândalo. Certo dia encontrei numa gaveta da cômoda xales brancos, verdes, lilases, cobertos de naftalina, empilhados como num armarinho; não tive coragem de lhe perguntar o que pensava fazer com eles. Não precisávamos ganhar a vida, todos os meses chegava dinheiro dos campos que ia sempre aumentando. Mas era só o tricô que distraía Irene, ela mostrava uma destreza maravilhosa e eu passava horas olhando suas mãos como puas prateadas, agulhas indo e vindo, e uma ou duas cestinhas no chão onde se agitavam constantemente os novelos. Era muito bonito.Como não me lembrar da distribuição da casa! A sala de jantar, lima sala com gobelins, a biblioteca e três quartos grandes ficavam na parte mais afastada, a que dá para a rua Rodríguez Pena. Somente um corredor com sua maciça porta de mogno isolava essa parte da ala dianteira onde havia um banheiro, a cozinha, nossos quartos e o salão central, com o qual se comunicavam os quartos e o corredor. Entrava-se na casa por um corredor de azulejos de Maiorca, e a porta cancela ficava na entrada do salão. De forma que as pessoas entravam pelo corredor, abriam a cancela e passavam para o salão; havia aos lados as portas dos nossos quartos, e na frente o corredor que levava para a parte mais afastada; avançando pelo corredor atravessava-se a porta de mogno e um pouco mais além começava o outro lado da casa, também se podia girar à esquerda justamente antes da porta e seguir pelo corredor mais estreito que levava para a cozinha e para o banheiro. Quando a porta estava aberta, as pessoas percebiam que a casa era muito grande; porque, do contrário, dava a impressão de ser um apartamento dos que agora estão construindo, mal dá para mexer-se; Irene e eu vivíamos sempre nessa parte da casa, quase nunca chegávamos além da porta de mogno, a não ser para fazer a limpeza, pois é incrível como se junta pó nos móveis. Buenos Aires pode ser uma cidade limpa; mas isso é graças aos seus habitantes e não a outra coisa. Há poeira demais no ar, mal sopra uma brisa e já se apalpa o pó nos mármores dos consoles e entre os losangos das toalhas de macramê; dá trabalho tirá-lo bem com o espanador, ele voa e fica suspenso no ar um momento e depois se deposita novamente nos móveis e nos pianos.Lembrarei sempre com toda a clareza porque foi muito simples e sem circunstâncias inúteis. Irene estava tricotando no seu quarto, por volta das oito da noite, e de repente tive a idéia de colocar no fogo a chaleira para o chimarrão. Andei pelo corredor até ficar de frente à porta de mogno entreaberta, e fazia a curva que levava para a cozinha quando ouvi alguma coisa na sala de jantar ou na biblioteca. O som chegava impreciso e surdo, como uma cadeira caindo no tapete ou um abafado sussurro de conversa. Também o ouvi, ao mesmo tempo ou um segundo depois, no fundo do corredor que levava daqueles quartos até a porta. Joguei-me contra a parede antes que fosse tarde demais, fechei-a de um golpe, apoiando meu corpo; felizmente a chave estava colocada do nosso lado e também passei o grande fecho para mais segurança.Entrei na cozinha, esquentei a chaleira e, quando voltei com a bandeja do chimarrão, falei para Irene:— Tive que fechar a porta do corredor. Tomaram a parte dos fundos.Ela deixou cair o tricô e olhou para mim com seus graves e cansados olhos.— Tem certeza?Assenti.— Então — falou pegando as agulhas — teremos que viver deste lado. Eu preparava o chimarrão com muito cuidado, mas ela demorou um instante para retornar à sua tarefa. Lembro-me de que ela estava tricotando um colete cinza; eu gostava desse colete.Os primeiros dias pareceram-nos penosos, porque ambos havíamos deixado na parte tomada muitas coisas de que gostávamos. Meus livros de literatura francesa, por exemplo, estavam todos na biblioteca. Irene pensou numa garrafa de Hesperidina de muitos anos. Freqüentemente (mas isso aconteceu somente nos primeiros dias) fechávamos alguma gaveta das cômodas e nos olhávamos com tristeza. — Não está aqui.E era mais uma coisa que tínhamos perdido do outro lado da casa. Porém também tivemos algumas vantagens. A limpeza simplificou-se tanto que, embora levantássemos bem mais tarde, às nove e meia por exemplo, antes das onze horas já estávamos de braços cruzados. Irene foi se acostumando a ir junto comigo à cozinha para me ajudar a preparar o almoço. Depois de pensar muito, decidimos isto: enquanto eu preparava o almoço, Irene cozinharia os pratos para comermos frios à noite. Ficamos felizes, pois era sempre incômodo ter que abandonar os quartos à tardinha para cozinhar. Agora bastava pôr a mesa no quarto de Irene e as travessas de comida fria.Irene estava contente porque sobrava mais tempo para tricotar. Eu andava um pouco perdido por causa dos livros, mas, para não afligir minha irmã, resolvi rever a coleção de selos do papai, e isso me serviu para matar o tempo. Divertia-nos muito, cada um com suas coisas, quase sempre juntos no quarto de Irene que era o mais confortável. Às vezes Irene falava: — Olha esse ponto que acabei de inventar. Parece um desenho de um trevo?Um instante depois era eu que colocava na frente dos seus olhos um quadradinho de papel para que olhasse o mérito de algum selo de Eupen e Malmédy. Estávamos muito bem, e pouco a pouco começamos a não pensar. Pode-se viver sem pensar.(Quando Irene sonhava em voz alta eu perdia o sono. Nunca pude me acostumar a essa voz de estátua ou papagaio, voz que vem dos sonhos e não da garganta. Irene falava que meus sonhos consistiam em grandes sacudidas que às vezes faziam cair o cobertor ao chão. Nossos quartos tinham o salão no meio, mas à noite ouvia-se qualquer coisa na casa. Ouvíamos nossa respiração, a tosse, pressentíamos os gestos que aproximavam a mão do interruptor da lâmpada, as mútuas e freqüentes insônias.Fora isso tudo estava calado na casa. Durante o dia eram os rumores domésticos, o roçar metálico das agulhas de tricô, um rangido ao passar as folhas do álbum filatélico. A porta de mogno, creio já tê-lo dito, era maciça. Na cozinha e no banheiro, que ficavam encostados na parte tomada, falávamos em voz mais alta ou Irene cantava canções de ninar. Numa cozinha há bastante barulho da louça e vidros para que outros sons irrompam nela. Muito poucas vezes permitia-se o silêncio, mas, quando voltávamos para os quartos e para o salão, a casa ficava calada e com pouca luz, até pisávamos devagar para não incomodar-nos. Creio que era por isso que, à noite, quando Irene começava a sonhar em voz alta, eu ficava logo sem sono.) É quase repetir a mesma coisa menos as conseqüências. Pela noite sinto sede, e antes de ir para a cama eu disse a Irene que ia até a cozinha pegar um copo d'água. Da porta do quarto (ela tricotava) ouvi barulho na cozinha ou talvez no banheiro, porque a curva do corredor abafava o som. Chamou a atenção de Irene minha maneira brusca de deter-me, e veio ao meu lado sem falar nada. Ficamos ouvindo os ruídos, sentindo claramente que eram deste lado da porta de mogno, na cozinha e no banheiro, ou no corredor mesmo onde começava a curva, quase ao nosso lado.Sequer nos olhamos. Apertei o braço de Irene e a fiz correr comigo até a porta cancela, sem olhar para trás. Os ruídos se ouviam cada vez mais fortes, porém surdos, nas nossas costas. Fechei de um golpe a cancela e ficamos no corredor. Agora não se ouvia nada.— Tomaram esta parte — falou Irene. O tricô pendia das suas mãos e os fios chegavam até a cancela e se perdiam embaixo da porta. Quando viu que os novelos tinham ficado do outro lado, soltou o tricô sem olhar para ele.— Você teve tempo para pegar alguma coisa? — perguntei-lhe inutilmente.— Não, nada.Estávamos com a roupa do corpo. Lembrei-me dos quinze mil pesos no armário do quarto. Agora já era tarde.Como ainda ficara com o relógio de pulso, vi que eram onze da noite. Enlacei com meu braço a cintura de Irene (acho que ela estava chorando) e saímos assim à rua. Antes de partir senti pena, fechei bem a porta da entrada e joguei a chave no ralo da calçada. Não fosse algum pobre-diabo ter a idéia de roubar e entrar na casa, a essa hora e com a casa tomada.

Gêneros textuais: artigo de opinião


Novo de novo
Por Estéfani Martins para o zine Páginas Vazias
Coluna Ouvidosnegros
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Versões de músicas consagradas já proporcionaram a humanidade momentos únicos tanto de horror tacanho e descartável como de prazer estético incomparável. Exemplificam a primeira tradição, as versões de gosto duvidoso de sambas históricos assassinados pelas interpretações de Emílio Santiago e Simone. Do outro lado, merecem honrosa lembrança as muitas versões inspiradas de velhos blues interpretados por bandas como Rolling Stones, Canned Heat, Cream, etc. Outra lembrança imediata é a versão do clássico “Maracatu atômico” do trovador moderno Jorge Mautner orquestrada pela banda símbolo do manguebeat Chico Science e Nação Zumbi, ou ainda a versão de “Bullet blue Sky” do U2 feita com a dureza e a potência do Sepultura, que, aliás, deu mais consistência à música do que seus autores conseguiram. Vale lembrar também as versões do Metallica feitas pelo ótimo quarteto Apocalyptica, especialmente a já antes belíssima “Fade to Black”, que ganhou uma versão irretocável, sem dizer nas versões arrebatadoras de “Master of Puppets”, “Seek and destroy”, entre outras. Outro grande momento em que músicas já excelentes foram reinventadas por obra de gênios como Elis Regina e Hermeto Pascoal foi no Festival de Montreaux, em 1979, quando eles deram cores novas a clássicos da música brasileira com interpretações maravilhosas e no improviso de “Corcovado”, “Asa branca” e “Garota de Ipanema”.
Sobre o mesmo tema, sempre ficava desconfiado de versões que muito modificaram especialmente o estilo original da música, mas tenho ficado surpreso com pancadas como “Killing in the name of” da sempre saudosa banda Rage Against the Machine, reinterpretada pelo inventivo grupo The Apples; ou “War Pigs” e “The Wizard” do eterno Black Sabbath, ou a quebradeira total do clássico “Moby Dick” do Led, ou ainda “Crostown traffic” do deus Jimi Hendrix e “Helter Skelter”, do álbum branco dos Beatles convertidas em petardos funk pela excelente e criativa banda Bonerama.
Enfim, versões ou regravações são formas de sentirmos novidade no que se imortalizou pela qualidade e pela atemporalidade e, assim, ficamos com dois ou mais olhares sobre uma mesma obra. Claro que isso pode também servir como caça-níqueis ou mesmo como “solução” para a falta de inspiração sempre a espreita até de grandes bandas. Entretanto, esses são os riscos necessários de se lidar com a novidade, especialmente quando o novo visita a maravilha dos velhos e monumentais long plays na estante.

Gêneros textuais: artigo de opinião


Música imprevista brasileira
Por Estéfani Martins para o zine Páginas Vazias
Coluna Ouvidosnegros
sambluesoul.blogspot.com

            Há algumas semanas, em uma das minhas regulares viagens de carro, ouvia para não pegar no sono um clássico do Sepultura, o “Roots”, disco fundamental da banda mineira que unia o metal a percussões indígenas e africanas. Enquanto isso, pensava de onde poderia ter nascido essa coragem inovadora de levar o berimbau, Carlinhos Brown e índios xavantes para o muitas vezes sectário universo do Metal. Numa volta às origens do estilo, ao sagrado Black Sabbath, ou mesmo antes e depois deles, não conseguia ver inspiração para a revolução proposta pelo Sepultura neste disco de 1996.
            Ao longo da audição do disco, lembrei-me de alguns debates que havia participado sobre a Tropicália, em função deles e de muitas leituras sobre o assunto feitas no ano de 2008, pude entender a extensão da influência desse movimento nascido da união improvável entre ritmos populares brasileiros (samba, maracatu, embolada, etc.); música pop norte-americana e inglesa, em especial os Beatles e seu Sargent Pepper’s; canção de protesto e antropofagia. Nesse momento, fim da década de 1960, a música popular brasileira vivia uma ebulição já mais vista tanto por causa do início do reconhecimento pelos jovens dos ritmos fundadores de nossa tradição musical como do estabelecimento de canal de comunicação mais rápido e dinâmico com o que acontecia fora do Brasil, desta festa de estímulos nascem músicas de absoluta ousadia estética, por que não política, como Batmacumba. “Roots” é filho torto dessa ousadia, que, aliás, revolucionou a música eletrônica, inspirou o Manguebeat, ou seja, ensinou a todos  misturar ritmos sem culpa e sem preconceito. O legado especialmente do disco “Tropicália ou Panis et Circensis” é ter feito a cultura brasileira aceitar definitivamente a origem étnica miscigenada que a determinou, mais do que aceitar, usar com dignidade e de forma criativa o fato de termos nascido em um país de paradoxos e amalgamas, os quais justamente são a base de nossa cultura musical desde então.
            Comparada à influência da música brasileira em todo o mundo atualmente, só se pode citar a norte-americana, ainda que de lá venha referências importantes e fundamentais para a música desde então como o Blues, o Country, o Jazz, o Rock, o Funk, o Soul e o RAP; não é em função da tradição musical norte-americana que a música de inúmeros países desenvolveu esse viés imerso no signo da mistura, da mescla e da experimentação que a produção musical atual, especialmente a independente, tem como sua principal característica.
            Apesar de recebido à época com certa resistência pelos fãs, o disco “Roots” estabilizou-se como uma linha divisória na história do Metal e influenciou não poucas bandas posteriormente. Cumpriu, assim, uma função de norte, de orientação para a música feita neste planeta, como, aliás, outros discos antes dele: “Canção do amor demais”, Elizeth Cardoso; “Coisas”, Moacir Santos; “Tábua de esmeralda”, Jorge Ben; “Mutantes”, Mutantes; “Secos e Molhados”, Secos e Molhados; “Cabeça Dinossauro”, Titãs, “Da lama ao caos”, Nação Zumbi; entre felizmente tantos outros. Eis os arquitetos da música brasileira, mais... da música mundial.

Gêneros textuais: artigo de opinião


Coluna: Ouvidosnegros publicada originalmente no zine Páginas Vazias
Estefani Martins

Coluna de um ouvinte dedicado da música negra. Aquela... que pariu o rock que forjou o metal pesado com que se fez – bem no centro do que é rápido e visceral - o som feito morte, feito pancada, feito demônio, feito lixo, feito tristeza que nos fez e nos faz ficar batendo cabeça pelas quebradas.

          Nada mais óbvio, mas nada mais obrigatório do que começar essa coluna tão ambiciosa – vale dizer, falar de Blues, Funk, Soul e Rock antes dos deuses do Black Sabbath colocarem mais peso e mais escuridão no som – com aquele que é chamado de mestre, de rei, de vagabundo e de demoníaco, responsável por transformar a música do século XX ao gravar num quarto de hotel no Mississipi em duas sessões históricas nos anos de 1936 e 1937 os vinte e poucos Blues mais conhecidos de todos os tempos. Refiro-me ao mestre Robert Johnson, mulherengo, músico incomparável, briguento e genial, que aprendeu a tocar violão e morreu misteriosamente, o que criou em torno dele uma lenda que só rivaliza com o seu talento em tamanho e longevidade.
          Certamente, não há guitarrista que mesmo sem querer ou saber não tenha dedilhado alguns acordes poderosos desse guitarrista espontâneo, inspirado e que, segundo muitos, ele próprio e Son House, fez um pacto com o demônio para aprender a tocar de forma até aquele momento inédita. Tal era seu talento que o maior de todos – Jimi Hendrix - fez por diversas vezes reverências apaixonadas ao velho mestre.
          Esse pacto foi feito numa encruzilhada, ele dizia. Muitos acreditam nisso porque em cerca de um ano de sumiço, passou de músico medíocre a gênio do instrumento. Assim, nasceu a tal lenda, talvez até mesmo o primeiro passo pelo nosso continente do Black Metal (sic). Este bluesman de infância difícil e incerta é autor de clássicos como “Crossroads”, “If a had a possession over judgement day”, “Love in vain”, dentre tantos outros petardos viscerais influenciados por aqueles considerados ídolos pela lenda do blues: Charley Patton, Son House, Lonnie Johnson, Skip James e Kokomo Arnold.
          O rei do Delta Blues foi reverenciado e tocado por bandas e intérpretes como Led Zeppelin, Muddy Waters, Jimi Hendrix, White Stripes, Cowboy Junkies, Ben Harper, etc., além, é claro, das já clássicas versões dos Rolling Stones para "Love In Vain" e "Stop Breaking Down", John Mayall para "Rambling On My Mind", Cream para "Four Until Late" e "Crossroads", Eric Clapton para "Steady Rollin Man" e Foghat para "Terraplane Blues".
          Pedra fundamental para se estudar o Blues em tudo que ele tem de soturno, de melódico, de revolucionário e de proximidade com o que chamamos, em alguns casos, de intimidade com o demônio. Muito antes de todas as bandas influenciadas por idéias anticristãs ou demoníacas, Robert Johnson mostrava-se como aparentado, como amigo do diabo. São exemplos as músicas "Crossroads", "Me And The Devil" e "Hellhound On My Trail". Diferente das razões de hoje, o culto a imagem do demônio no Blues é mais um ato político do que religioso ou místico, até porque a idéia era de todos os modos contestar e criticar a vida imposta violentamente pelos brancos contra negros mesmo depois da abolição da escravidão nos EUA. Era uma forma de se dizer o que a maioria não queria ouvir, uma forma apaixonada de comunicar uma visão diferente e subversiva da idéia de bem e mal, até porque, se o bem fosse representado verdadeiramente pela hipocrisia ideológica do cidadão médio do sul dos EUA até o início do século XX, qualquer um com sanidade mental seria torcedor de carteirinha do capeta.
          Essa questão talvez ajude a entender a fascinação de tantas bandas com o tema, como é o caso de parte dos integrantes do Kinks, de bandas como Black Sabbath, Kiss, Mercyful Fate, Venom, dentre muitas outras.
Então, boa audição, boa viagem. Ouçam também os cinco CDs da série “Blues: a musical journey” produzidos por Martin Scorsese e vejam os vídeos sobre o Robert Johnson no Youtube, em especial, o que conta a história dele em ritmo de Repente misturado com Blues, presente no álbum “Navegaita” do grande Flávio Guimarães, um dos melhores gaitistas da atualidade.
          É só.

Gêneros textuais: fronteiras - crônica, conto ou poema?


O tubista

Numa manhã, dessas meio bestas, meio úmidas
Ouço sem cerimônias uma banda tocar
No meio disso
Lembro da tuba
Do bombardão
.
.
.
Experimento uma cosmovisão
Que entrega
Que desapego
Apresento-lhes: o tubista

Grande homem dos bastidores das bandas, das filarmônicas, das sinfônicas e de tudo quanto há de aglomerados mais ou menos inspirados de músicos. Nesses grupos, não se vê a tuba esmerando-se em solos, em estripulias sonoras egoístas, porque o lugar dela é ou parece ser no pano de fundo das orquestras, esquecida em sua gravidade.
Além desses atributos capuchinhos, sobre o tubista, especialmente aos mais modestos em suas posses, ressalto a arte imprescindível de fazer caber esse generoso instrumento em seus carros populares, quem sabe até equilibrando-se em motonetas, motocas e lambretas, mas nesse quesito destaco com honrarias os tubistas que usam o transporte coletivo, os ônibus, os metrôs para tão nobre e distinta locomoção... Que devoção à música! Que odisséia apaixonada pela coadjuvância! Tubista - este devotado - esquecido pelo jazz, eclipsado pelo trompete, pelo sax, até mesmo pela suave e tímida clarineta. Quem são os grandes tubistas da história que minha ignorância, quem sabe, não me deixa ver? Quais são as peças musicais que os tornaram eternos? Quem foi seu Chopin, seu Coltrane, seu Moacir Santos? Tantas perguntas intrigantes, até revoltantes, mas em meio a isso tudo fica a pergunta maior, a mais incômoda para muitos: o que é mesmo uma tuba?

VS

Gêneros textuais: crítica


The White Stripes - "Get Behind Me Satan" (2005)

A dupla de Detroit White Stripes lança seu quinto álbum “Get Behind Me Satan” (2005), certamente mais lírico e refinado do que os anteriores, sem, contanto, esquecer o “Blues Punk” consagrado primeiro na cena de Rock indie estrangeira, para depois conquistar seu lugar também no “esquemão”, mérito para a banda por saber entreter com música de qualidade feita pela econômica, porém cada vez mais eficaz, Mag White (bateria), e pelo guitarrista e cantor inspiradíssimo, Jack White (guitarras e vocais).
          O som dramático - “Red Rain” - e cru - “Instinct blues” - ainda está presente, porém com uma meia dose de humor nesse novo disco como em “The nurse”, “My doorbell” e “As ugly as I seem”. O hit “Blue orchid” se tornou um clássico do grupo pelo poder e  beleza das suas guitarras. Agora, há espaço também para o romance (ou para a ausência dele!?) na linda balada “Forever for her(is over for me)”. Enfim, disco maravilhoso, por ser autêntico e comprometido com o passado glorioso do Rock’n’Roll e do Blues.

Bandas relacionadas: The Black Keys, Thee Butchers’ Orchestra, The Jon Spencer Blues Explosion, Cachorro Grande, Canned Heat, MC5, Daniel Norgen, Dan Auerbach, etc.

Estéfani Martins

Gêneros textuais: microcontos


             Numa madrugada infestada de calores e urgências, ele supôs pela primeira vez quais seriam os motivos que o afligiam desde épocas mais felizes, aparentemente, percebeu a pouca e tênue verdade que o impedia de ver a verdade. Era um monstro claro como a porta do quarto entreaberta, lucidez - megeraque nos arremessa sem aviso no fosso incipiente da consciência associada a um tipo raro de percepção, o bom senso. (Leitor, caso você não tenha se reconhecido nessas palavras, dispense essa leitura. Procure literatura mais feliz.)
        Assim, em mais um dia sou humanamente forjado pelos rigores do cotidiano, cotidiano, cotidiano, cotidiano, cotidiano, cotidiano, cotidiano, cotidiano, cotidiano, cotidiano, cotidiano, cotidiano, cotidianocotidiano, cotidiano, cotidiano, cotidiano, cotidiano, cotidiano, cotidiano, cotidiano, cotidiano, cotidiano, cotidiano, cotidiano. The End, um ponto final é uma vida.

VS

        Grand Funk na vitrola digital, já eram da noite as horas, hora de fazer uma JAM. Comecei novamente o ofício de achar algo para escrever, um tema, uma negação, uma existência mais relevante do que a minha... De repente, saudade do Brasil, Bezerra da Silva parece uma saída. Eis que um grito irrompe, é da casa ao lado. Mulher, homem? Não sei. A voz dizia apenas que o rock nunca morreria, achei a princípio que tinha como vizinho um fóssil desse que se vê languidamente dançando em algum documentário sobre Woodstock ou adjacências ou ainda, sem saber, tratava-se de alguém que coincidentemente fez a viagem inversa a que eu fazia. Enquanto eu votava, ele ia. Desencontros. Naquela noite parecia improvável que alguém vivesse os mesmo dilemas que eu, os mesmos desatinos, as mesmas pendências. Se, para mim, porque o Rock, porque pedir ao invés de ter o controle de tudo em sua própria casa...

VS

Autobiografia vespertina

         Estava em casa na sala corrigindo provas de meus alunos e ouvindo um disco do Led, “Presence”, em “Achilles last land”, petardo único, maravilhoso, perfeição grega e fruição Rock’n’Roll, o que esperar mais. Súbito, campainha, paro a música, carteiro, mais uma correspondência dessas que te perseguem, que, inquiridora, parece viva na sua ânsia de chegar a algum lugar. Volto para o trabalho, aperto o play, ou o inverso, não importa, som novamente ecoa, grandioso pela sala. Sozinho, as provas parecem um cadáver que disseco, sangue jorra por todos os lados, junto ao som, ecoa vivo pelo ambiente.
         Nessa tarde besta, parece menos importante ver do que ouvir. Assim, ouço, um disco que me lembra o já remoto adolescer em long play, tempos de graça sinistra aqueles, cercado de bons amigos, grandes influências faziam-me declinar sempre que possível os convites para shoppings, boates e outros desertos artificiais, outros diriam paraísos, mas – eu – não respeito sobremaneira os deuses que nos fizeram, respeito a sua palavra, respeito seus versos, sua prosa. Baudelaire seria implacável com este devoto, até porque recentemente foi alvejado por livro que lhe rouba um título, mais, suga-lhe a tinta que corre em suas veias divinas, maldita pós-modernidade, malditas são as intertextualidades, porque nos fascinam, por vezes, rasteiramente. Divagações também têm retorno, enfim, amigos, mestres de muito rock, jazz e blues – nessa época, ainda não tinha descoberto o Brasil – todavia, e as mulheres, onde elas estavam que pareciam não gostar desse magrelo e cabeçudo, periférico geográfica, econômica, pessoal e coletivamente.
        O disco rolava... “Nobody’s fault but mine”, as lembranças....as lembranças, clichês a espera de serem caçados com a paixão devida pelos profissionais. Todos sempre nos encontramos no poço mais profundo que o mais profundo círculo infernal, é o poço do óbvio, do clichê e do senso comum. Todos nós, sem exceção, em algum momento, por lá passamos, fazemos turismo e, à vezes, fixamos residência. É uma espécie de condomínio fechado subterrâneo em que cegos falam alegremente da luz. Lembrava dos tempos de absoluta e aparentemente crônica dureza, do não saber, quase nada e achar que tudo se sabe, deliciosos paradoxos.

VS


Gêneros textuais: nanocontos


Maria sonhou que morria dormindo, não acordou.

Victor Az





70, 70, 70, 71, 95, zero. O coração parou.

Ricardo Barioni

Gêneros textuais: nanoconto


Não é que seu filho era a cara do vizinho...

Gabriel Ramalho

Gêneros textuais: manifesto


Manifesto do Contra

Considerando que só a desordem parece se encontrar com o progresso; que os que seguiram brasileiros foram trucidados ou morreram na miséria; que nem ser não é possível e que o ser não prova ser melhor que o nada: nós somos do contra. Contra a transformação constante para a permanência irritante do que se recusa a morrer! Contra os maquiadores desses cadáveres, os cirurgiões dessas plásticas e suas performances dramáticas! Contra o centralismo antidemocrático da administração, a dispersão fratricida da revolução e os danos por baixo dos panos!
Somos contra o alívio sintético dos livrinhos da auto-ajuda e dos analgésicos, o sexo anal sem preservativos e a preservação dos ativos suspeitos em contas escuras e mal cheirosas, transmitindo epidemias de desleixo e desinteresse.
Somos contra o baixo preço da vida: os hospitais com equipamentos de segunda, os seguros saúde com profissionais de terceira e a devastação provocada pelos planos econômicos de quinta nas caladas das noites alheias sem prejuízo aos seus autores sobreviventes.
Somos contra as inutilidades domésticas para os aflitos indecentes e a execração pública dos bandidos indigentes. Os que salvam a própria cabeça pisando nos pescoços, nos processos, nos arquivos. Contra os que escutam conversas pra se entender, os que transmitem recados pra aproveitar e os que vendem a identidade pra se acobertar. Contra o câncer do serviço secreto e das tropas especiais. Contra o desprezo pelos programas espaciais, nossa única saída de nós mesmos.
Também somos contra os ensimesmados pelos ensinamentos sagrados, que passam a vida prática atrás da teoria física, morrendo com artrite no pensamento embotado. Contra a macumba, contra deus e o diabo. Contra as pragas egípcias, contra o mal olhado. Contra os que reparam, invejam, atrasam! Contra os que diante de uma pergunta invocam advogados escusos ou tornam-se juizes uniformizados em portas de cadeia degradadas, geridas e gestadas por traficantes operantes e abastecidas com as cestas básicas da má consciência da elite produtiva, que se destrói em carros velozes, helicópteros particulares e bancos escolares de quarta classe.
Estamos contra os que perdem seu tempo reclamando do tempo, inventando cursos mirabolantes, conhecimentos extravagantes e diplomas esquisitos para tudo o que é preciso saber por iniciativa própria.
Contra o gigantesco espaço dedicado à propaganda de ilusões minúsculas. O "emocionamento" aritmético da razão e a racionalização gramatical dos sentimentos. As ciências das opiniões e os palpites irracionais em meio aos linchamentos e às bacanais de processos fraudulentos ou cocaína pura.
Contra os que vestem as carapuças, as carapaças, as catapultas. Contra a inteligência militar e a burrice das emboscadas. Contra o desprezo preguiçoso pela violência dos argumentos. Contra a especulação imobiliária, a incontinência urinária e bucal dos caçadores de marginais. Contra os pequenos que são iguais e os grandes indiferentes. Contra a eterna purificação dos paraísos fiscais, onde os recursos nacionais viram iates sensacionais, malas especiais e contratos de gaveta. Contra jornalistas amigos de artistas, artistas patrocinados por políticos e políticas de achatamento da ousadia. Contra os críticos céticos e os éticos mesquinhos. Contra o terceiro setor da caridade, a terceira via da bondade e a encruzilhada da inocência. Contra os malandros que se escondem em ternos de bacanas e bacanas que posam de inocentes. Contra as coleções de segredos fechadas nos palácios. Contra a difusão condescendente da ignorância dos casebres e do elogio de fachada. Contra o estrangeiro que incomoda e contra a pátria conhecida. Contra o ponto batido, a vontade adiada, a bala perdida. Contra a família unida pela falta de dinheiro para os aluguéis de cada um. Contra a apropriação pessoal do bem comum e a comunização das pessoalidades. Contra a propriedade inconsentida da privacidade e a privacidade deliberada e inconsciente da propriedade. Contra os que servem os pratos mórbidos da vingança e os que os comem frios com um pé na cova. Contra o presunto na sarjeta e a Maizena na lasanha.
Contra o pão engordado com bromato, a terra grilada por força das armas e a liberdade às custas da lei.
Contra o voto útil, de cabresto, por cabeça e o voto de confiança. Contra a institucionalização da dúvida e da dívida. Contra os que são feitos pelo que fazem e os que jazem nestas cadeias e cadeiras de compromisso, onde um paletó dobrado é a única marca de sua impertinência. Contra os que pedem amor, os que imploram perdão, os que têm o prazer na confusão, gozando espremidos em surdina na latrina de nossa História.
Contra o comprimido, a vacina e o antibiótico que desestimulam os pacientes de serem agentes de suas autonomias! Contra os que conquistam a própria força à força dos cavalos que escoiceiam! Contra os que fazem conta, os que tomam conta e os que não contam com isso!
Aliás, na hora em que tudo se tornar realmente insuportável, nós viramos do avesso, depois do outro lado. Somos do contra. Somos contrários. Contra você, contra os do contra, contra mim... é o fim; estamos desconversados.

Fernando Bonassi

Gêneros textuais: conto


Um saco de risadas

Eu sou feliz. Sou muito feliz. Sou feliz demais. Eu sou tão feliz, mas tão feliz, que cada degrau da minha vida é um sorriso onde eu piso. Ah essa brancura da dentadura que se espalha! Essa cara de palhaço estampada no espelho! Já nem tenho tempo de parar pra rir: rio dormindo, rio acordado; rio correndo, rio parado. Rio um riso arrepiado, rio o riso arrependido. Rio o riso dos amantes, rio o riso dos maridos. Riso esganiçado. Riso empedernido. Rio quando cago. Rio quando mijo. Rio quando o sol aparece, rio quando fica escondido. Ninguém pode me proibir. Um desgraçado também pode rir! Rio pra seduzir, rio pra disfarçar, rio pra distrair, rio pra suportar. O eterno exercício do maxilar! Rio no almoço, rio no jantar. O riso da garganta em carne viva, riso que se morde na gengiva. Rio de tudo, rio de nádegas, riso absurdo, riso de cócegas. O riso feito um soluço. Riso rido como um susto! O riso de terror petrificado. Rir de um corpo estatelado. Risos calculados. O riso embasbacado dos casais apaixonados. E eu rio com o que tenho de dentes! Alegria enxurrada de enchentes! Riso histérico dos dementes! Rio porque é duro. Rio porque é de graça. Gás hilariante espalhado pelas praças! Rir com segurança, rir das ameaças! Rio quando cheiro. Rio sem vergonha. Rio quando fumo. Rio com maconha o riso dos malucos. Rio quando encontro, rio quando esbarro. Rio porque é sério, rio tirando sarro - a língua mergulhada na saliva e no catarro! Rio tomando água, rio bebendo pinga. Rio porque são frescas. Rio porque são lindas. O riso como um pote de pimenta gargalhando num sorriso que aumenta. Rio o riso dos primeiros, rio o riso dos cansados. Rio o riso dos coveiros, rio o riso dos defuntos. Rio pra me lembrar. Rio pra me esquecer. Risos pra resfriar, risos pra aquecer. Rir o riso dos parentes, rir o riso dos amigos, rir o riso dos contentes, rir o riso dos falidos. Rio o riso do pecado. Rir um riso preocupado. O riso do cachorro se pendura pelo rabo. O riso das hienas quando encontram a carniça. O riso dos ateus que precisam ir à missa. O riso imaculado, o vagabundo e o invocado. O riso dos maduros, o riso dos meninos. Sorrisos em apuros: o destino dos forçados, a sina dos verdugos. O riso amarelo da educação. O riso budista da meditação. Rir como aviso. A pura tentação do riso. As risadas meladas das tortas arremessadas. Rir o riso pastelão, riso engarrafado de televisão. As mesmas piadas repassadas e caímos na cilada! Rio em congestionamento, rio em casamento. Rio com farinha, rio com cimento. Rio direto. Do bom, do melhor, do desprezível. Rir que o riso é infalível. Uma risada grudando na outra, fazendo uma música rachada no céu da minha boca. Rio da minha cara, rio da minha fome. A vingança que se cospe no prato frio. Rir à puta que pariu! Rio por dentro de pesadelos esquisitos; nas marquises dos edifícios espremidos, rir o riso dos pobres, rir o riso dos ricos (é bom que fique claro: o riso dos bacanas é o mesmo dos coitados). Com a cara, a coragem, a covardia. Rio todo dia. Rio porque sim, rio porque não. Rio de janeiro, fevereiro ou março. Rio de mim, rio do fim, rio de você. Ontem ainda "estava" feliz, mas hoje "eu sou". Nada abala minha felicidade. Eu sou feliz. Feliz até à carne. Feliz demais. Risos. Só risos. Nada mais. Exalo felicidade por todos os poros. Uma felicidade contagiante mesmo. Uma hora dessas, puxa! Eu nem sei...

Fernando Bonassi

Gêneros textuais: conto


A IGREJA DO DIABO
Machado de Assis

Intensivão - Uberaba - 2012-1 - Módulo 2 - A língua e a linguagem - variações linguísticas, funções e figuras da linguagem


Módulo 2 - A língua e a linguagem - variações linguísticas, funções e figuras da linguagem
Por Estéfani Martins

sexta-feira, 11 de maio de 2012

Gêneros textuais: charges de cartunistas do Leste Europeu

Charge (cartum)

Palavra originada do francês "charge", que significa em linhas gerais "ação vigorosa contra alguém". Pode ser definida como uma espécie de desenho caricatural, burlesco ou satírico -  com ou sem legenda - normalmente publicado em mídias impressas como jornais, ainda que atualmente existam muitos "sites" dedicados a essa forma de banda desenhada. Trata de assunto jornalístico ou de acontecimento atual de forma humorística baseada na ironia, no sarcasmo, no escárnio ou no "humor negro". Dentre os temas abordados, a política, a economia e as celebridades são mais frequentes. Comumente, é feita em apenas um quadro.









Gêneros textuais: fábulas e intertextualidade


Fábula 1

A cigarra e a formiga
Esopo

Em pleno Verão, sob um sol escaldante, a formiga trabalhava sem descanso. Ia e vinha dos campos para o formigueiro, para encher a sua despensa de alimentos.
Entretanto, deitada descansadamente à sombra, a cigarra desfrutava bons momentos. Cantava alegremente o dia todo, sem preocupações nem cansaço.
Quando passava por ali, a formiga via sempre a cigarra a descansar.
-Por que é que trabalhas tanto, formiga? Faz como eu, aproveita a vida! - dizia-lhe a cigarra, tranquilamente.
O Verão passou e chegaram as primeiras nuvens trazidas pelo Outono. A formiga apressou-se ainda mais para encher a despensa, enquanto a cigarra observava o céu, inquieta. Cansada e satisfeita com o seu trabalho, a formiga verificou que tinha alimento de sobra para o Inverno. Finalmente, podia descansar tranqüila.
Entretanto, a cigarra via cair as últimas folhas das árvores. Em pouco tempo, tudo ficou coberto de neve. Ela já não tinha vontade de cantar. O Sol tinha desaparecido.  A cigarra estava com fome e tremia de frio.
Lembrou-se então da formiga trabalhadora e foi bater à porta do formigueiro, à procura de abrigo e alimento.
A formiga disse-lhe:
- Enquanto te divertias, eu trabalhava. Pois agora estás a colher o que plantaste!
E fechou-lhe a porta na cara.
Gelada e esfomeada, a cigarra ficou sozinha no meio da floresta. Tinha um longo Inverno pela frente para se arrepender de ter sido tão preguiçosa.

Fábula 2

A formiga má
Monteiro Lobato

Já houve entretanto, uma formiga má que não soube compreender a cigarra e com dureza a repeliu de sua porta.
Foi isso na Europa, em pleno inverno, quando a neve recobria o mundo com seu cruel manto de gelo.
A cigarra, como de costume, havia cantado sem parar o estio inteiro e o inverno veio encontrá-la desprovida de tudo, sem casa onde abrigar-se nem folhinhas que comesse.
Desprovida, bateu à porta da formiga e implorou - emprestado, notem! - uns miseráveis restos de comida. Pagaria com juros altos aquela comida de empréstimo, logo que o tempo o permitisse.
Mas a formiga era uma usurária sem entranhas. Além disso, invejosa. Como não soubesse cantar, tinha ódio à cigarra por vê-la querida de todos os seres.
- Que fazia você durante o bom tempo?
- Eu...eu cantava!...
-Cantava? Pois dance agora, vagabunda! - e fechou-lhe a porta no nariz.
Resultado: a cigarra ali morreu entanguidinha; e quando voltou a primavera o mundo apresentava um aspecto mais triste. É que faltava na música do mundo o som estridente daquela cigarra, morta por causa da avareza da formiga. Mas se a usurária morresse, quem daria pela falta dela?