Caras e caros,
Primeiramente,
boa noite. Gostaria de pedir desculpas pelo atraso desta postagem, mas cometi um
engano no momento de salvá-la, pois ao invés de publicá-la, eu apenas
a salvei. Em todo caso, está publicada com a contribuição da aluna Jordana do 2ºD
do COC de Uberlândia, que indicou o excelente vídeo do Steve Jobs.
Abraços,
Professor
Estéfani Martins
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- Estéfani Martins
1 - 1ª anos, 2º anos, 3º anos e PV
Determinação e
coragem a serviço da leitura
“O livreiro da favela”
Com um acervo de quase
quatro mil livros, Otávio Jr., morador da Vila Cruzeiro, no Rio, abre a
primeira biblioteca do Complexo do Alemão
Débora Rubin
Ele quase virou jogador de
futebol. Foi por pouco que a trajetória de Otávio Jr. não repetiu a saga de
muitos meninos de comunidades carentes do País. A habilidade com a bola foi
rapidamente substituída pelo amor às letras. Sorte dele e dos quase 150 mil
moradores dos Complexos do Alemão e da Penha, favelas do Rio de Janeiro que
ficaram marcadas pela invasão de forças de segurança no final do ano passado,
dando fim ao império dos traficantes. Em vez de amargar nas peneiras dos
grandes times, sonhando ser um novo craque, Otávio Jr. se tornou um obstinado
difusor da leitura. Há seis anos, ele criou o projeto Ler é 10 – Leia Favela,
uma biblioteca itinerante que circula pelos dois complexos. Agora, com o apoio
de duas grandes organizações, ele está transformando um antigo forró local em
uma biblioteca fixa que contará com um acervo de quase quatro mil livros, fruto
de doações de editoras e de colaboradores. O carioca de 27 anos também é um
aspirante a escritor. Na semana passada, ele lançou seu primeiro livro, “O
Livreiro do Alemão” (Panda Books), no qual conta sua trajetória.
Nascido e criado na Vila
Cruzeiro, de onde saiu o jogador Adriano, Otávio se apaixonou por literatura
quando, ainda menino, encontrou um saco de lixo cheio de brinquedos. Enquanto
os amigos se digladiavam pelos achados, ele viu uma edição velha e surrada do
livro infantojuvenil “Don Gatón”. Foi abduzido para o mundo das letras, de onde
nunca mais voltou. Dali em diante, saiu pela vizinhança pedindo livros
emprestados. Paralelamente, começou a escrever. Sobretudo quando o fogo cruzado
entre traficantes e policiais ficava intenso no morro. Enquanto sua biblioteca
particular crescia, Otávio começou a escrever peças teatrais que ele mesmo
representava em escolas da região. Cobrava uma entrada modesta, de R$ 1, e
exercitava sua verve artística. No final do mês, ganhava uns trocos e ajudava a
mãe com as despesas.
O desejo de se tornar escritor
o fez tomar atitudes ousadas, como ir até a casa de autores como Ziraldo e
mandar suas histórias para as editoras. Ouviu muito não e levou porta na cara
até o dia em que um gentil dono de gráfica topou rodar seu livreto
gratuitamente. Por causa de sua ambição – fazer sua comunidade ler –, Otávio já
participou de dezenas de eventos literários, viajou por países da América do
Sul e dá palestras em todo o país. Seu maior orgulho, entretanto, é ter
introduzido a leitura na vida de dez mil crianças e adolescentes. Em sua missão
quixotesca, consegue índices de leitura acima da média nacional. “Enquanto o
brasileiro lê quatro livros por ano, há crianças aqui lendo isso em uma
semana”, orgulha-se.
No ano passado, durante a
invasão no complexo, Otávio deixou os recortes de jornal com reportagens sobre
seu trabalho em cima da mesa caso alguém invadisse sua casa. “Se eles vissem
meus computadores e equipamentos, podiam facilmente achar que era tudo
roubado”, diz. Hoje, celebra, a comunidade dorme em paz. E, no que depender
dele, ao embalo de algum conto de fadas ou épico literário.
2 - 1ª anos, 2º anos, 3º anos e PV
Um pouco das
ideias não convencionais de alguém incomum.
3 - 1ª anos, 2º anos, 3º anos e PV
Estudantes e a
educação chilena: um exemplo para o Brasil
4 - 2º anos, 3º anos e PV
Os muçulmanos e
os EUA
Estigmatizados após o 11 de Setembro,
muçulmanos nos EUA ainda confiam no futuro
Sylvain Cypel
The Prospect
Muçulmano
americano tem um risco duas vezes maior de ser discriminado pelo governo que um
não muçulmano, segundo estudo do MIT (Massachusetts Institute of Technology) de
2006
Há um ano, pouco
depois de explodir uma polêmica sobre a construção de um centro islâmico na
periferia do Marco Zero, lugar dos atentados de 11 de setembro de 2001 em Nova
York, outros manifestantes se mobilizaram em Staten Island, a menor das cinco
circunscrições da cidade. O motivo era idêntico: impedir a construção de uma
mesquita no bairro de Midland Beach. No entanto, recentemente foi inaugurada
uma mesquita lá, que ninguém contestou. Presidente da seção nova-iorquina do
Conselho de Relações Americano-Islâmico (Cair), principal associação muçulmana
de direitos civis nos EUA, Zead Ramadan não se surpreende.
"A
islamofobia é um fenômeno político", ele diz. "A hostilidade
raramente vem das populações locais, ela é fomentada do exterior por grupos
organizados, geralmente em função de interesses políticos." Há um ano, a
mobilização contra a construção de mesquitas foi instigada, segundo ele, devido
à aproximação das eleições legislativas. Depois que elas passaram, a agitação
se acalmou. "Haverá uma forte recuperação ao se aproximar a eleição
presidencial", prevê Ramadan.
Dez anos depois
desses atentados "medonhos", "uma calamidade", segundo seus
termos, onde estão os muçulmanos americanos? Sua comunidade, de 4 milhões a 6
milhões de indivíduos, representa menos de 2% da população americana. Ela se
divide mais ou menos pela metade entre um grupo mais antigo de afro-americanos
(1,5 milhão a 2,5 milhões dos 38 milhões de negros) e de imigrados recentes e
seus descendentes. Esses são muitas vezes originários do subcontinente indiano,
uma minoria é árabe e observa-se um crescimento regular dos originários da
África negra.
À diferença de
outros imigrantes, em particular hispânicos, seu nível médio de renda e de
educação é superior à média americana. Quanto a sua "experiência",
"os fatos são paradoxais", estima John Esposito, que ocupa a cadeira
de estudos islâmicos na Universidade Georgetown em Washington: "Os que
interrogamos dizem rapidamente sentir uma erosão de seu status e de sua
aceitação; mas a maioria se diz também muito feliz de viver aqui. Melhor, em
plena crise, sua confiança no sonho americano é bem superior à média.".
Esses paradoxos
se encontram nas pesquisas recentes: segundo um estudo Gallup (3.800 muçulmanos
interrogados em abril), 60% declaram "se realizar cada vez mais" nos
EUA, somente 3% se confessam "infelizes". Por outro lado, 48%
enfrentaram recentemente uma discriminação, o índice mais alto de todas as
comunidades pesquisadas. Quanto ao olhar que se tem deles, depois dos
atentados, 14% dos americanos percebiam o islã como uma "religião que
incentiva a violência"; esse número cresceu para se estabilizar desde 2005
em um terço dos pesquisados.
Entretanto,
pouco depois do 11 de Setembro, conta Ramadan, "vizinhas vieram procurar
minha cunhada e lhe propuseram: 'Dê-nos sua lista de compras que as faremos
para você, para que não precise ir ao centro comercial de hijab'. A partir de
2004 ela recomeçou a sair sem temor; no pior dos casos às vezes ela ouve um
comentário negativo."
O relatório
publicado pelo Cair em 2002 notava uma "situação gravemente deteriorada
dos direitos civis dos muçulmanos". Desde então, a associação constatou um
movimento duplo: primeiro uma melhora regular da aceitação dos muçulmanos a
partir de 2003, depois uma nova degradação a partir de 2008, estes enfrentando
novamente uma hostilidade difusa ou declarada. Sua explicação: a eleição de
Barack Obama instigou os fantasmas antimuçulmanos e sobretudo: "a América
está em crise econômica. Como sempre, as minorias são apontadas com o
dedo".
Em 2006, um
estudo do MIT de Boston concluiu que um muçulmano americano tem um risco duas
vezes maior de ser discriminado pelo governo que um não muçulmano, e um
muçulmano que tenta entrar no território, seis vezes maior que um não
muçulmano. O vice-ministro da Justiça, Thomas Perez, constatou em 2010 que as
discriminações sociais desse grupo (na contratação, no trabalho, na moradia...)
haviam aumentado 50% desde 2001. Quanto às violências, cerca de mil foram
recenseadas em dez anos contra pessoas vistas como "muçulmanas" ou
"árabes".
Mesmo que as
autoridades só sejam informadas de um quarto dos casos, em relação à população
global e em uma década o número não é impressionante. "Ninguém é linchado
em público como foram por tanto tempo os negros", diz o responsável
comunitário. "Mas a pressão cresce, e a preocupação dos nossos com
isso." Uma preocupação não tanto física como devida a uma atmosfera que o
professor Esposito resume assim: no dia seguinte ao 11 de Setembro, o pastor
ultraconservador Jerry Falwell tratou Maomé como o "primeiro
terrorista". Ele teve de pedir desculpas. Hoje os grupos islamófobos são
conhecidos, e sobretudo "uma série de políticos navegam na ideia de uma
ameaça islâmica interna, legitimando as piores declarações", ele diz.
A lista desses
grupos se estendeu da Stop Islamisation of America, de Pam Geller, à Jihad Watch,
de David Horowitz e Robert Spencer. Este último, autor dos livros "A
Verdade sobre Maomé" e "O Guia Politicamente Incorreto do Islã",
foi citado como fonte de inspiração por Anders Behring Breivik, o fanático
autor do massacre de 22 de julho na Noruega. Spencer também é cronista do
"New York Post" e "especialista" convidado para alguns
debates na televisão.
Em 30 de agosto
de 2008, a "Time" deu o título na capa: "A América é
islamofóbica?", investigando esse fenômeno "inédito". O
"New York Times" dedicou em 2010 um longo retrato a Geller, que se
declara "racista" antimuçulmana. Ele insistiu em 31 de julho com
David Yerushalmi, um religioso judeu ultraortodoxo apresentado como coordenador
e financista do movimento islamófobo americano. Este privilegia dois temas
recorrentes. Primeiro, a ideia de que a fidelidade dos muçulmanos à pátria
americana é "enganadora" ou "ilusória" porque impossível;
depois, a de que sua ambição é dominadora, com a vontade oculta de impor a
todos a lei muçulmana, xariá. Publicada em 2009, uma obra de Paul David Gaubatz
e Paul Sperry, "A Máfia Muçulmana - No mundo secreto e subterrâneo que
conspira para islamizar a América", constitui uma espécie de
"Protocolo dos Sábios de Sião" transposto para Meca.
Esses delírios
recebem um apoio mais ou menos assumido de certas publicações e de intelectuais
americanos não considerados marginais. Como, por exemplo, a revista
conservadora "American Thinker", cuja linguagem se torna incendiária
desde que aborda o islamismo. O mais preocupante, diz Esposito, é que políticos
"os legitimam": "Não é por acaso que Newt Gingrich declarou que
o islã constituirá um dos temas chaves da próxima eleição presidencial". O
ex-presidente republicano da Câmara dos Deputados é candidato à nomeação de seu
partido para enfrentar Barack Obama na presidencial de 2012.
As chances de
Gingrich são muito fracas. Mas, dez anos depois do 11 de Setembro, a questão
assombra muitos muçulmanos: mesmo que a campanha sobre a suposta "religião
oculta" de Obama pareça encerrada, muitos temem que o islã seja novamente
promovido à categoria de tema polêmico em 2012. Este se enxertaria em um
ambiente já pesado, onde, de um lado, o recente massacre norueguês aumentou os
temores de que um "louco" cometa, sobre o fundo de islamofobia
delirante, uma dessas chacinas habituais nos EUA. E onde, ao contrário,
atentados como esse que custou a vida de 13 soldados e feriu outros 28 em uma
base texana em 5 de novembro de 2009 e aquele, fracassado, de 1º de maio de
2010 em Times Square (Nova York), que poderia ter sido terrível, demonstraram
que jovens muçulmanos americanizados são sensíveis aos apelos do jihadismo
terrorista.
Em 2 de agosto,
Denis McDonough, conselheiro adjunto da Defesa nacional, apresentou seu
programa de combate ao islamismo radical. Seu prefácio é assinado por Barack
Obama. "As comunidades americano-muçulmanas cujos filhos, famílias e
vizinhos são visados pelo recrutamento da Al Qaeda são muitas vezes também os
mais bem situados para assumir a frente" da luta contra o terrorismo,
escreve o presidente.
Ramadan pretende
se inscrever nesse voluntarismo. "A Constituição e a democracia salvam
este país de suas más inclinações; são nossas melhores proteções",
proclama. O professor Esposito quer ser otimista: "O 11 de Setembro teve
efeitos terrivelmente negativos para os muçulmanos, mas não modificou o sentido
da evolução. Historicamente, católicos e judeus igualmente se chocaram com
grandes hostilidades, hoje esquecidas. Os muçulmanos ainda conhecerão altos e
baixos na América. Mas, se nenhum drama maior intervier, sua via será a mesma:
a de uma integração finalmente bem-sucedida."
Enquanto isso,
constata o primeiro, cada vez mais pais "temem por seus filhos".
"Eles tentam facilitar sua integração 'anglicizando' seus nomes."
Samir ou Oussama tornam-se Samy; Shakira ou Soraya, Sara... Como entre todos os
imigrantes do mundo.
Tradução: Luiz
Roberto Mendes Gonçalves
5 - 2º anos, 3º anos e PV
Negrinha
Monteiro Lobato
Negrinha era uma
pobre órfã de sete anos. Preta? Não; fusca, mulatinha escura, de cabelos ruços
e olhos assustados.
Nascera na
senzala, de mãe escrava, e seus primeiros anos vivera-os pelos cantos escuros
da cozinha, sobre velha esteira e trapos imundos. Sempre escondida, que a
patroa não gostava de crianças.
Excelente
senhora, a patroa. Gorda, rica, dona do mundo, amimada dos padres, com lugar
certo na igreja e camarote de luxo reservado no céu. Entaladas as banhas no
trono (uma cadeira de balanço na sala de jantar), ali bordava, recebia as
amigas e o vigário, dando audiências, discutindo o tempo. Uma virtuosa senhora
em suma — “dama de grandes virtudes apostólicas, esteio da religião e da
moral”, dizia o reverendo.
Ótima, a dona
Inácia.
Mas não admitia
choro de criança. Ai! Punha-lhe os nervos em carne viva. Viúva sem filhos, não
a calejara o choro da carne de sua carne, e por isso não suportava o choro da
carne alheia. Assim, mal vagia, longe, na cozinha, a triste criança, gritava
logo nervosa:
— Quem é a peste
que está chorando aí?
Quem havia de
ser? A pia de lavar pratos? O pilão? O forno? A mãe da criminosa abafava a
boquinha da filha e afastava-se com ela para os fundos do quintal, torcendo-lhe
em caminho beliscões de desespero.
— Cale a boca,
diabo!
No entanto,
aquele choro nunca vinha sem razão. Fome quase sempre, ou frio, desses que
entanguem pés e mãos e fazem-nos doer...
Assim cresceu
Negrinha — magra, atrofiada, com os olhos eternamente assustados. Órfã aos
quatro anos, por ali ficou feito gato sem dono, levada a pontapés. Não
compreendia a idéia dos grandes. Batiam-lhe sempre, por ação ou omissão. A
mesma coisa, o mesmo ato, a mesma palavra provocava ora risadas, ora castigos.
Aprendeu a andar, mas quase não andava. Com pretextos de que às soltas reinaria
no quintal, estragando as plantas, a boa senhora punha-a na sala, ao pé de si,
num desvão da porta.
— Sentadinha aí,
e bico, hein?
Negrinha
imobilizava-se no canto, horas e horas.
— Braços
cruzados, já, diabo!
Cruzava os
bracinhos a tremer, sempre com o susto nos olhos. E o tempo corria. E o relógio
batia uma, duas, três, quatro, cinco horas — um cuco tão engraçadinho! Era seu
divertimento vê-lo abrir a janela e cantar as horas com a bocarra vermelha,
arrufando as asas. Sorria-se então por dentro, feliz um instante.
Puseram-na
depois a fazer crochê, e as horas se lhe iam a espichar trancinhas sem fim.
Que idéia faria
de si essa criança que nunca ouvira uma palavra de carinho? Pestinha, diabo,
coruja, barata descascada, bruxa, pata-choca, pinto gorado, mosca-morta,
sujeira, bisca, trapo, cachorrinha, coisa-ruim, lixo — não tinha conta o número
de apelidos com que a mimoseavam. Tempo houve em que foi a bubônica. A epidemia
andava na berra, como a grande novidade, e Negrinha viu-se logo apelidada assim
— por sinal que achou linda a palavra. Perceberam-no e suprimiram-na da lista.
Estava escrito que não teria um gostinho só na vida — nem esse de personalizar
a peste...
O corpo de
Negrinha era tatuado de sinais, cicatrizes, vergões. Batiam nele os da casa
todos os dias, houvesse ou não houvesse motivo. Sua pobre carne exercia para os
cascudos, cocres e beliscões a mesma atração que o ímã exerce para o aço. Mãos
em cujos nós de dedos comichasse um cocre, era mão que se descarregaria dos
fluidos em sua cabeça. De passagem. Coisa de rir e ver a careta...
A excelente dona
Inácia era mestra na arte de judiar de crianças. Vinha da escravidão, fora
senhora de escravos — e daquelas ferozes, amigas de ouvir cantar o bolo e
estalar o bacalhau. Nunca se afizera ao regime novo — essa indecência de negro
igual a branco e qualquer coisinha: a polícia! “Qualquer coisinha”: uma mucama
assada ao forno porque se engraçou dela o senhor; uma novena de relho porque
disse: “Como é ruim, a sinhá!”...
O 13 de Maio
tirou-lhe das mãos o azorrague, mas não lhe tirou da alma a gana. Conservava
Negrinha em casa como remédio para os frenesis. Inocente derivativo:
— Ai! Como
alivia a gente uma boa roda de cocres bem fincados!...
Tinha de
contentar-se com isso, judiaria miúda, os níqueis da crueldade. Cocres: mão
fechada com raiva e nós de dedos que cantam no coco do paciente. Puxões de
orelha: o torcido, de despegar a concha (bom! bom! bom! gostoso de dar) e o a
duas mãos, o sacudido. A gama inteira dos beliscões: do miudinho, com a ponta
da unha, à torcida do umbigo, equivalente ao puxão de orelha. A esfregadela:
roda de tapas, cascudos, pontapés e safanões a uma — divertidíssimo! A vara de
marmelo, flexível, cortante: para “doer fino” nada melhor!
Era pouco, mas
antes isso do que nada. Lá de quando em quando vinha um castigo maior para
desobstruir o fígado e matar as saudades do bom tempo. Foi assim com aquela
história do ovo quente.
Não sabem! Ora!
Uma criada nova furtara do prato de Negrinha — coisa de rir — um pedacinho de
carne que ela vinha guardando para o fim. A criança não sofreou a revolta —
atirou-lhe um dos nomes com que a mimoseavam todos os dias.
— “Peste?”
Espere aí! Você vai ver quem é peste — e foi contar o caso à patroa.
Dona Inácia
estava azeda, necessitadíssima de derivativos. Sua cara iluminou-se.
— Eu curo ela! —
disse, e desentalando do trono as banhas foi para a cozinha, qual perua choca,
a rufar as saias.
— Traga um ovo.
Veio o ovo. Dona
Inácia mesmo pô-lo na água a ferver; e de mãos à cinta, gozando-se na
prelibação da tortura, ficou de pé uns minutos, à espera. Seus olhos contentes
envolviam a mísera criança que, encolhidinha a um canto, aguardava trêmula
alguma coisa de nunca visto. Quando o ovo chegou a ponto, a boa senhora chamou:
— Venha cá!
Negrinha
aproximou-se.
— Abra a boca!
Negrinha abriu
aboca, como o cuco, e fechou os olhos. A patroa, então, com uma colher, tirou
da água “pulando” o ovo e zás! na boca da pequena. E antes que o urro de dor
saísse, suas mãos amordaçaram-na até que o ovo arrefecesse. Negrinha urrou
surdamente, pelo nariz. Esperneou. Mas só. Nem os vizinhos chegaram a perceber
aquilo. Depois:
— Diga nomes
feios aos mais velhos outra vez, ouviu, peste?
E a virtuosa
dama voltou contente da vida para o trono, a fim de receber o vigário que
chegava.
— Ah, monsenhor!
Não se pode ser boa nesta vida... Estou criando aquela pobre órfã, filha da
Cesária — mas que trabalheira me dá!
— A caridade é a
mais bela das virtudes cristas, minha senhora —murmurou o padre.
— Sim, mas
cansa...
— Quem dá aos
pobres empresta a Deus.
A boa senhora
suspirou resignadamente.
— Inda é o que
vale...
Certo dezembro
vieram passar as férias com Santa Inácia duas sobrinhas suas, pequenotas,
lindas meninas louras, ricas, nascidas e criadas em ninho de plumas.
Do seu canto na
sala do trono, Negrinha viu-as irromperem pela casa como dois anjos do céu —
alegres, pulando e rindo com a vivacidade de cachorrinhos novos. Negrinha olhou
imediatamente para a senhora, certa de vê-la armada para desferir contra os
anjos invasores o raio dum castigo tremendo.
Mas abriu a
boca: a sinhá ria-se também... Quê? Pois não era crime brincar? Estaria tudo
mudado — e findo o seu inferno — e aberto o céu? No enlevo da doce ilusão,
Negrinha levantou-se e veio para a festa infantil, fascinada pela alegria dos
anjos.
Mas a dura lição
da desigualdade humana lhe chicoteou a alma. Beliscão no umbigo, e nos ouvidos,
o som cruel de todos os dias: “Já para o seu lugar, pestinha! Não se enxerga”?
Com lágrimas
dolorosas, menos de dor física que de angústia moral —sofrimento novo que se
vinha acrescer aos já conhecidos — a triste criança encorujou-se no cantinho de
sempre.
— Quem é, titia?
— perguntou uma das meninas, curiosa.
— Quem há de
ser? — disse a tia, num suspiro de vítima. — Uma caridade minha. Não me
corrijo, vivo criando essas pobres de Deus... Uma órfã. Mas brinquem,
filhinhas, a casa é grande, brinquem por aí afora.
— Brinquem!
Brincar! Como seria bom brincar! — refletiu com suas lágrimas, no canto, a
dolorosa martirzinha, que até ali só brincara em imaginação com o cuco.
Chegaram as
malas e logo:
— Meus
brinquedos! — reclamaram as duas meninas.
Uma criada
abriu-as e tirou os brinquedos.
Que maravilha!
Um cavalo de pau!... Negrinha arregalava os olhos. Nunca imaginara coisa assim
tão galante. Um cavalinho! E mais... Que é aquilo? Uma criancinha de cabelos
amarelos... que falava “mamã”... que dormia...
Era de êxtase o
olhar de Negrinha. Nunca vira uma boneca e nem sequer sabia o nome desse
brinquedo. Mas compreendeu que era uma criança artificial.
— É feita?... —
perguntou, extasiada.
E dominada pelo
enlevo, num momento em que a senhora saiu da sala a providenciar sobre a
arrumação das meninas, Negrinha esqueceu o beliscão,o ovo quente, tudo, e
aproximou-se da criatura de louça. Olhou-a com assombrado encanto, sem jeito,
sem ânimo de pegá-la.
As meninas
admiraram-se daquilo.
— Nunca viu
boneca?
— Boneca? —
repetiu Negrinha. — Chama-se Boneca?
Riram-se as fidalgas
de tanta ingenuidade.
— Como é boba! —
disseram. — E você como se chama?
— Negrinha.
As meninas
novamente torceram-se de riso; mas vendo que o êxtase da bobinha perdurava,
disseram, apresentando-lhe a boneca:
— Pegue!
Negrinha olhou
para os lados, ressabiada, como coração aos pinotes. Que ventura, santo Deus!
Seria possível? Depois pegou a boneca. E muito sem jeito, como quem pega o
Senhor menino, sorria para ela e para as meninas, com assustados relanços de
olhos para a porta. Fora de si, literalmente... era como se penetrara no céu e
os anjos a rodeassem, e um filhinho de anjo lhe tivesse vindo adormecer ao
colo. Tamanho foi o seu enlevo que não viu chegar a patroa, já de volta. Dona
Inácia entreparou, feroz, e esteve uns instantes assim, apreciando a cena.
Mas era tal a
alegria das hóspedes ante a surpresa extática de Negrinha, e tão grande a força
irradiante da felicidade desta, que o seu duro coração afinal bambeou. E pela
primeira vez na vida foi mulher. Apiedou-se.
Ao percebê-la na
sala Negrinha havia tremido, passando-lhe num relance pela cabeça a imagem do
ovo quente e hipóteses de castigos ainda piores. E incoercíveis lágrimas de
pavor assomaram-lhe aos olhos.
Falhou tudo
isso, porém. O que sobreveio foi a coisa mais inesperada do mundo — estas
palavras, as primeiras que ela ouviu, doces, na vida:
— Vão todas
brincar no jardim, e vá você também, mas veja lá, hein?
Negrinha ergueu
os olhos para a patroa, olhos ainda de susto e terror. Mas não viu mais a fera
antiga. Compreendeu vagamente e sorriu.
Se alguma vez a
gratidão sorriu na vida, foi naquela surrada carinha...
Varia a pele, a
condição, mas a alma da criança é a mesma — na princesinha e na mendiga. E para
ambos é a boneca o supremo enlevo. Dá a natureza dois momentos divinos à vida
da mulher: o momento da boneca — preparatório —, e o momento dos filhos —
definitivo. Depois disso, está extinta a mulher.
Negrinha, coisa
humana, percebeu nesse dia da boneca que tinha uma alma. Divina eclosão!
Surpresa maravilhosa do mundo que trazia em si e que desabrochava, afinal, como
fulgurante flor de luz. Sentiu-se elevada à altura de ente humano. Cessara de
ser coisa — e doravante ser-lhe-ia impossível viver a vida de coisa. Se não era
coisa! Se sentia! Se vibrava!
Assim foi — e
essa consciência a matou.
Terminadas as
férias, partiram as meninas levando consigo a boneca, e a casa voltou ao
ramerrão habitual. Só não voltou a si Negrinha. Sentia-se outra, inteiramente
transformada.
Dona Inácia,
pensativa, já a não atazanava tanto, e na cozinha uma criada nova, boa de
coração, amenizava-lhe a vida.
Negrinha, não
obstante, caíra numa tristeza infinita. Mal comia e perdera a expressão de
susto que tinha nos olhos. Trazia-os agora nostálgicos, cismarentos.
Aquele dezembro
de férias, luminosa rajada de céu trevas adentro do seu doloroso inferno,
envenenara-a.
Brincara ao sol,
no jardim. Brincara!... Acalentara, dias seguidos, a linda boneca loura, tão
boa, tão quieta, a dizer mamã, a cerrar os olhos para dormir. Vivera realizando
sonhos da imaginação. Desabrochara-se de alma.
Morreu na
esteirinha rota, abandonada de todos, como um gato sem dono. Jamais,
entretanto, ninguém morreu com maior beleza. O delírio rodeou-a de bonecas,
todas louras, de olhos azuis. E de anjos... E bonecas e anjos remoinhavam-lhe
em torno, numa farândola do céu. Sentia-se agarrada por aquelas mãozinhas de
louça — abraçada, rodopiada.
Veio a tontura;
uma névoa envolveu tudo. E tudo regirou em seguida, confusamente, num disco.
Ressoaram vozes apagadas, longe, e pela última vez o cuco lhe apareceu de boca
aberta.
Mas, imóvel, sem
rufar as asas.
Foi-se apagando.
O vermelho da goela desmaiou...
E tudo se esvaiu
em trevas.
Depois, vala
comum. A terra papou com indiferença aquela carnezinha de terceira — uma
miséria, trinta quilos mal pesados...
E de Negrinha
ficaram no mundo apenas duas impressões. Uma cômica, na memória das meninas
ricas.
— “Lembras-te
daquela bobinha da titia, que nunca vira boneca?”
Outra de
saudade, no nó dos dedos de dona Inácia.
— “Como era boa
para um cocre!...”
Monteiro Lobato, natural de Taubaté (SP), nasceu em 18/04/1882. É uma
das figuras excepcionais das letras brasileiras. Jornalista, contista, criador
de deliciosas histórias para crianças, suscitador de problemas, ensaísta e
homem de ação, encheu com seu nome um largo período da vida nacional. Com a
publicação do livro de contos "Urupês", em julho de 1918, quando já
contava com 36 anos de idade, chama para o seu talento de escritor a atenção de
todo o país. Cita-o Ruy Barbosa, em discurso, encontrando no seu Jeca Tatu um
símbolo da realidade rural brasileira. Lança-se à indústria editorial, publica
livros e mais livros — "Onda Verde", "Idéias de Jeca Tatu",
"Cidades Mortas", "Negrinha", "Fábulas", "O
Choque", etc. Fracassa como editor, ao lançar a firma Monteiro Lobato
& Cia., mas volta com a Companhia Editora Nacional, ao lado de Octales
Marcondes, e triunfa. Tenta a exploração de petróleo, e acaba na cadeia,
perseguido pela ditadura de Getúlio Vargas. Não só escreve, como traduz sem
pausa, dezenas e dezenas de livros, especialmente de Kipling. Uma vida cheia. E
uma grande obra, que lhe preservará o nome glorioso. Foi um grande homem, um
grande brasileiro e um dos maiores escritores — em todo o mundo — de histórias
para crianças. Basta dizer que, no período de 1925 a 1950 foram vendidos
aproximadamente um milhão e quinhentos mil exemplares de seus livros.
Era, de fato, um ser plural: escritor precursor do realismo fantástico,
escritor de cartas, escritor de obras infantis, ensaísta, crítico de arte e
literatura, pintor, jornalista, empresário, fazendeiro, advogado, sociólogo,
tradutor, diplomata, etc. Faleceu na cidade de São Paulo (SP), no dia 04 de
julho de 1948.
O texto acima foi publicado originalmente em livro do mesmo nome, tendo
sido selecionado por Ítalo Moriconi e consta de "Os cem melhores contos
brasileiros do século", editora Objetiva — Rio de Janeiro, 2000, pág. 78.
6 - 3º anos e PV
Seguros, mas
temerosos. Isso é possível?
Americanos se sentem mais seguros, porém
ainda estão temerosos
Peter Applebome
e Marjorie Connelly
The New York
Times
Homem caminha
entre cerca de 3000 mil bandeiras posicionadas por estudantes e membros da
Universidade Pepperdine, em Malibu, nos Estados Unidos, em memória das vítimas
do atentado ocorrido em 11 de setembro de 2001, em Nova York
Dez anos depois
do 11 de setembro, os norte-americanos ainda estão andando numa corda-bamba
emocional, sentindo um conforto maior por conta dos esforços antiterrorismo do
governo, mas com um número significativo ainda temeroso de que uma catástrofe
como aquela se repita.
Pesquisas do New
York Times/CBS feitas em agosto em Nova York e por todo o país também revelaram
uma crença generalizada de que a cidade ainda não se recuperou emocionalmente
dos ataques, das profundas divisões quanto à proposta de um centro cultural
islâmico perto do marco zero e das preocupações, especialmente em Nova York, de
que os trabalhadores de resgate no marco zero não foram tratados com justiça.
Apesar de todo o
sentimento de mais segurança, os entrevistados expressaram uma sensação de que
o mundo havia mudado e de que é menos seguro do que antes dos ataques. 79% dos
nova-iorquinos disseram que a cidade sempre terá que enfrentar a ameaça do
terrorismo, e 83% dos norte-americanos disseram que o país também.
“Dada a natureza
do mundo em que vivemos e a forma como alguns países nos veem, acho que outro
ataque aos Estados Unidos é inevitável em algum momento no futuro”, disse Walt
Sledzieski, 56, consultor de marketing de Boise, Idaho. “Mas ainda acredito que
estamos fazendo todas as coisas certas, dentro dos limites de nossas liberdades
e da foram que queremos agir como povo, para nos proteger.”
A pesquisa na
cidade foi conduzida com 1.027 adultos de 9 a 15 de agosto, e a pesquisa
nacional foi feita com 1.165 adultos entre 19 a 23 de agosto. Ambas as
pesquisas por telefone têm uma margem de erro de mais ou menos 3 pontos
percentuais.
De acordo com as
pesquisas, 38% dos moradores da cidade de Nova York acham que outro ataque
terrorista deve acontecer nos Estados Unidos nos próximos meses, menos do que
os 57% de uma pesquisa Times/CBS de cinco anos atrás. Nacionalmente, os números
daqueles que pensam que um ataque deve acontecer logo também caíram, de 59%
para 42%. A maior porcentagem de pessoas que se sentem seguras tem uma relação
com a impressão crescente de que o governo está trabalhando mais duro para
proteger a população. Quase metade dos moradores da cidade acha que o governo
federal fez o mesmo tanto que se esperava para manter o país a salvo do
terrorismo. Há cinco anos, apenas um quarto dos entrevistados se sentia assim.
Pouco mais da metade dos nova-iorquinos diz que o governo da cidade fez sua
parte para proteger Nova York e que a cidade foi preparada de forma adequada
para lidar com outro ataque.
Ainda assim,
muitos moradores de Nova York expressaram preocupação com o fato de que a
cidade não é suficientemente vigilante, particularmente nos metrôs: 57%
disseram que as medidas de segurança lá não são suficientes.
“A polícia de
Nova York está fazendo o melhor que pode, mas quando ouço falar sobre o que
acontece no exterior, o que os terroristas estão fazendo, fico inquieta porque
não sei quando eles podem atacar aqui novamente”, disse Geeta Ghaindranauth,
41, diretora de uma clínica de saúde da mulher, que trabalhou por quatro anos
no 102º andar da torre norte do World Trade Center.
Ela acrescentou:
“fico preocupada quando fico sabendo que quartéis dos bombeiros estão sendo
fechados e policiais estão sendo mandados embora. Sinto que precisamos deles
para nos proteger e nos manter seguros”.
As pesquisas
refletem a forma como o 11 de setembro tanto se apagou de certa forma nas
mentes das pessoas quanto como se mantém uma constante na vida norte-americana,
particularmente em Nova York.
Há cinco anos,
um pouco menos do que metade das pessoas em Nova York e no país disseram que
pensavam sobre o 11 de setembro pelo menos uma vez por semana. Nas últimas
pesquisas, 31% dos moradores da cidade e 27% do país disseram isso. Mas apenas
7% dos moradores da cidade acham que os nova-iorquinos se recuperaram
totalmente do impacto emocional dos ataques de 11 de setembro.
Os ataques
deixaram um resíduo de questões não resolvidas e preocupações.
Um quarto dos
norte-americanos diz ter sentimentos negativos em relação aos muçulmanos por
causa do ataque ao World Trade Center; 73% não. Da mesma forma, 20% dos
moradores de Nova York também dizem que tem sentimentos negativos em relação
aos muçulmanos por causa do 11 de setembro, enquanto 76% dizem que não.
Ainda há uma
divisão substancial sobre o centro cultural islâmico proposto a dois quarteirões
do marco zero. Apenas um terço dos moradores da cidade é a favor do projeto, o
mesmo que há um ano. Nacionalmente, apenas 27% das pessoas aprovam.
E apesar da
aprovação em dezembro de uma lei federal para oferecer indenizações e
tratamento para trabalhadores de recuperação do marco zero, as preocupações
continuam sobre como eles estão sendo tratados. Apenas um quarto dos moradores
da cidade diz que os trabalhadores de limpeza e resgate no marco zero foram
tratados com justiça, enquanto 58% diz que não foram.
“É uma falta de
cuidado grosseira e em grande escala ignorar os trabalhadores do marco zero,
tentar varrer tudo para debaixo do tapete”, disse Carol Lee, 48, do Queens. Ela
acrescentou: “ajudá-los seria o melhor memorial para as pessoas que morreram”.
O assassinato de
Osama bin Laden não é visto como algo que tenha efeitos de longo prazo sobre a
segurança e o terrorismo. Apenas 22% do público norte-americano pensa que a
ameaça de terrorismo contra os Estados Unidos diminuiu desde que Bin Laden foi
morto em maio.
Quase 60%, tanto
nacionalmente quanto em Nova York, diz que os eventos para lembrar o
aniversário do 11 de setembro devem continuar. Menos de 10% diz que os
aniversários deveriam ser totalmente eliminados, menos de um quinto diz que
deveria haver eventos a cada cinco anos e cerca de 10% diz que eles deveriam
ser a cada dez anos.
“É importante
que os jovens tenham alguma ideia do que a geração anterior a eles passou, para
que eles nunca esqueçam o que aconteceu”, disse Ethel Kruger, 76, aposentada de
Cameron, Wisconsin. “É muito importante que eles se lembrem das pessoas
pulando, lembrem das pessoas queimando, lembrem do pânico e das pessoas
corajosas que entraram para salvar as outras, lembrem da perda de vidas e dos
problemas para curar. Acho que há uma possibilidade muito real de a geração
mais jovem esquecer tudo isso.”
Outra pesquisa
com 246 adultos que disseram que perderam um amigo ou parente próximo no 11 de
setembro ofereceu um vislumbre sobre a angústia pessoal que ainda existe para
aqueles que foram mais afetados pelos ataques. 70% dos entrevistados eram
amigos de vítimas do 11 de setembro, 4% eram irmãos e o restante tinha outros
graus de parentesco.
A maior parte
dos 246 entrevistados disse que se recuperou apenas parcialmente do trauma
mental daquele dia. Um em cada seis disse que foi diagnosticado com algum
problema mental como resultado do 11 de setembro e, entre eles, quase todos
disseram que ainda sofrem do problema. Um terço disse que os filhos dos amigos
ou parentes que morreram ainda não se recuperaram emocionalmente.
A maior parte
dos amigos e parentes pesquisados estão satisfeitos com os planos de um
memorial no marco zero. Uma maioria disse que os eventos em memória do 11 de
setembro são um conforto. Mas quase 30% acham que os eventos perto do
aniversário dos ataques são experiências dolorosas, dificultando deixar o
passado para trás. Três quartos daquelse que perderam alguém próximo dizem que
o aniversário do 11 de setembro deveria continuar sendo observado anualmente, uma
proporção maior do que o público em geral.
Mas os números
não servem muito para transmitir a dor emocional que ainda paira enquanto as
pessoas tentam equilibrar a necessidade de lembrar e a de esquecer.
“A menos que eu
tenha Alzheimer, nunca esquecerei aquele dia”, disse Marian Carmellino de
Bronxville, N.Y., que disse que perdeu duas pessoas próximas nos ataques. “Onde
você vai depois disso? Se você não segue em frente, então eles venceram.”
Um número
surpreendente na pesquisa quanto aos efeitos do 11 de setembro quase não tem a
ver com o fato em si. Logo após o 11/9, os norte-americanos experimentaram uma
sensação de união. Mais de 60% disseram que o país estava no caminho certo nas
pesquisas nacionais Times/CBS feitas em 2001 logo após os ataques. A atitude
positiva durou pouco, e logo começou a declinar. Numa pesquisa Times/CBS feita
em junho de 2011, apenas 28% disseram que o país estava no caminho certo e 63%
disseram que ele estava indo na direção errada.
“Todos nos
Estados Unidos se uniram”, disse Scott Smith, 47, soldador de Anderson,
Carolina do Sul, que perdeu um colega de escola no World Trade Center. “Não
havia republicanos, democratas, liberais, conservadores. Todos estavam juntos.”
“Agora todos nos
EUA estão muito irritados”, diz ele. “É um mundo diferente”.
Como as três
pesquisas foram feitas
O mais recente
projeto de pesquisas New York Times/CBS consiste em três pesquisas por
telefone: dos Estados Unidos, da cidade de Nova York, e de amigos e parentes de
vítimas do 11 de setembro. Entrevistados de 16 pesquisas nacionais feitas pelo
The Times e CBS News de novembro de 2010 até junho de 2011 foram questionados
se eram parentes ou amigos próximos de alguém que morreu nos ataques teroristas
de 11 de setembro de 2001. Tentativas de entrar em contato com as 854 pessoas
identificadas como amigas e parentes foram feitas entre 11 e 23 de agosto, e as
entrevistas por telefone foram feitas com 246 adultos. A pesquisa da cidade de
Nova York foi baseada em entrevistas por telefone feitas entre 9 a 15 de agosto
com 1.027 adultos de todas as partes da Cidade de Nova York. A pesquisa
nacional foi feita entre 19 e 23 de agosto com 1.165 adultos. As margens de
erro são de mais ou menos 3 pontos percentuais tanto para a pesquisa nacional
quanto a da cidade de Nova York, e de seis pontos para a pesquisa com parentes
e amigos de vítimas do 11 de setembro. Os resultados da pesquisa com amigos e
parentes das vítimas de 11 de setembro foram pesados para que as características
dos 246 entrevistados casassem com as das 854 pessoas que originalmente se
qualificaram para serem chamadas. Michael R. Kagay de Princeton, Nova Jersey,
auxiliou o The Times na análise da pesquisa. Os questionários completos,
resultados e metodologia estão disponíveis no site nytimes.com/polls.
Allison Kopicki,
Marina Stefan e Megan Thee-Brenan contribuíram com a reportagem.
Tradução: Eloise
De Vylder
7 - 3º anos e PV
Sobre a
periferia da cultura e a cultura da periferia
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